ACORDO-TE, MANHÃ, P'RA TE DIZER
Que venhas, muito há a fazer, campos
Reclamam de Ceres seus cuidados, amplos
Estragos fez o gelo, oh, anda ver.
A terra a éter jaz, vem dar-lhe um beijo.
Não tardes, sobe aonde de alabastro
As nuvens joeiras por seu astro,
Ancinho delicado, mostram pejo.
Teu parâmetro veste, e aos vitrais
Desprende a sua cor, traz verde à mata,
Depõe as lantejoulas, pobres gemas,
Até a velha costureira as diz banais.
Vem, liberta os amantes das algemas
E mostra ao pescador a rica prata.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
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QUE ELA VOLTASSE. DIZ AO RAPAZINHO
Que lhe sinto a falta, ah, espada tão tíbia
Que ao rádio obriga, a tez diz-lhe tão nívea
Que lhe guardo p´ra sempre o retratinho.
Que já morreu eu sei o que vivia;
Que só por ter morrido lhe só espero
Que a vida bem lhe vá (tão mal lhe quero).
Que amei, diz-lhe, sim, mais do que devia,
Que eu sei o tarde que é diz-lhe hoje cedo,
Que só agora a quero, à coisa que era,
Que antes não sabia - ah se o soubera! -
Que é póstuma a paixão e prévio o medo.
Que a vida vem da esquina, é um quiosque,
Que triste que é, que vã, que asco, que, que...
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Que lhe sinto a falta, ah, espada tão tíbia
Que ao rádio obriga, a tez diz-lhe tão nívea
Que lhe guardo p´ra sempre o retratinho.
Que já morreu eu sei o que vivia;
Que só por ter morrido lhe só espero
Que a vida bem lhe vá (tão mal lhe quero).
Que amei, diz-lhe, sim, mais do que devia,
Que eu sei o tarde que é diz-lhe hoje cedo,
Que só agora a quero, à coisa que era,
Que antes não sabia - ah se o soubera! -
Que é póstuma a paixão e prévio o medo.
Que a vida vem da esquina, é um quiosque,
Que triste que é, que vã, que asco, que, que...
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
É OUTONO E CHOVE NO MEU SONETO.
Pingam as rosas, partem os comboios,
Aquela rapariga de olhos lóios
Tapou as belas gemas em véu preto.
O relógio da torre executa as horas:
Brada dobre balada o sino algoz.
Quem sou não foi quem fui, um albatroz
Debica-me quem resto, crava esporas.
Não choram arcadas mas traves mestras,
Arqueia o pé direito do meu dorso;
Num saco levo o corpo, um pobre torso
Que dou aos pobres pombos das fenestras.
Um sopro do precórdio asfixiado
Afrouxa a corda e sai triste e cansado.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Pingam as rosas, partem os comboios,
Aquela rapariga de olhos lóios
Tapou as belas gemas em véu preto.
O relógio da torre executa as horas:
Brada dobre balada o sino algoz.
Quem sou não foi quem fui, um albatroz
Debica-me quem resto, crava esporas.
Não choram arcadas mas traves mestras,
Arqueia o pé direito do meu dorso;
Num saco levo o corpo, um pobre torso
Que dou aos pobres pombos das fenestras.
Um sopro do precórdio asfixiado
Afrouxa a corda e sai triste e cansado.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Pecado Capital
A Vitória de Samotrácia
é mais ou menos a minha história
sentimental: tinham todas um corpo
e asas até
mas pouca cabeça.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
é mais ou menos a minha história
sentimental: tinham todas um corpo
e asas até
mas pouca cabeça.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Uma saison nos infernos
Tudo é breve: um deus,
o plâncton, o ferro.
O meu poema é uma miséria
comparado com o teu nome
no edital.
A voragem dos grandes estúdios,
a saída dos operários da fábrica,
a grande depressão
dos trinta anos:
Eu bebo
porque se não beber
não conduzo
este corpo a casa.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
o plâncton, o ferro.
O meu poema é uma miséria
comparado com o teu nome
no edital.
A voragem dos grandes estúdios,
a saída dos operários da fábrica,
a grande depressão
dos trinta anos:
Eu bebo
porque se não beber
não conduzo
este corpo a casa.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Declaração de Rendimentos
Considera este poema
num impresso de IRS;
considera que to dou de seguida
como quem entrega o modelo 2.
Considera a prestação de serviços,
os encargos dedutíveis,
as retenções na fonte,
o total uma vogal gorda.
Considera ainda as deslocações
no sujeito passivo,
a profissão de desgaste rápido,
o consumo de água e de energia.
Considera as correcções por excesso
dos limites legais,
as quotizações para o sindicato,
os pagamentos dos serviços prestados
por terceiros.
Considera o mapa de
amor
tizações e reintegrações,
o imobilizado corpóreo,
o exercício reduzido a letras
matemáticas de taxas e valores.
Considera tudo isto:
e paga o que deves.
Daniel Jonas
O Corpo está com o Rei
AEFLUP, 1997
num impresso de IRS;
considera que to dou de seguida
como quem entrega o modelo 2.
Considera a prestação de serviços,
os encargos dedutíveis,
as retenções na fonte,
o total uma vogal gorda.
Considera ainda as deslocações
no sujeito passivo,
a profissão de desgaste rápido,
o consumo de água e de energia.
Considera as correcções por excesso
dos limites legais,
as quotizações para o sindicato,
os pagamentos dos serviços prestados
por terceiros.
Considera o mapa de
amor
tizações e reintegrações,
o imobilizado corpóreo,
o exercício reduzido a letras
matemáticas de taxas e valores.
Considera tudo isto:
e paga o que deves.
Daniel Jonas
O Corpo está com o Rei
AEFLUP, 1997
Escrevo para me esvaziar de mim.
A cuspo. Para me libertar das musas.
De um saber imperial. Dos meus órgãos
Calçados com planisférios.
Escrevo para que te apaixones
pelo que pareço e não pelo que sou:
O meu interior é horrível e degradante
e eu por fora um límpido sorriso de candelabros.
Eu sou perigoso. A minha língua é azul.
Daniel Jonas
O Corpo está com o Rei
AEFLUP, 1997
A cuspo. Para me libertar das musas.
De um saber imperial. Dos meus órgãos
Calçados com planisférios.
Escrevo para que te apaixones
pelo que pareço e não pelo que sou:
O meu interior é horrível e degradante
e eu por fora um límpido sorriso de candelabros.
Eu sou perigoso. A minha língua é azul.
Daniel Jonas
O Corpo está com o Rei
AEFLUP, 1997
Nem um verbo me move
Isto é uma natureza morta: o teu compasso
de espera, mênstruo,
contra o priapismo do cálamo.
Tenho velas de aço para os teus ventos
de papel, para a dispersão
dos vocativos. Eu queria estar mais contente
se soubesse haver razões para isso,
depor-te a aporia destes dias
e trabalhar com novas certezas.
Em vez disso skaters faíscam
no centro da minha passagem, no meio
da minha vida
e a sua navegabilidade incondicional
desliza nesta aspereza da retina.
E isto é classe média: o cancro
como solução final; um fecho de braguilha
não esconde o faro latejante dos cães,
a trovoada latente.
Sou o homem do tempo, sou o homem do tempo.
Ando a tentar segurar este grande
aguaceiro que previ, de capote ando
a tentar pospor o optativo
porque na boca levo o gosto do desgosto
e tão sensíveis as papilas ao seu gosto.
Sou o homem do tempo, sou o homem do tempo.
Nem um verbo me move
desta irredutibilidade em desejar.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
de espera, mênstruo,
contra o priapismo do cálamo.
Tenho velas de aço para os teus ventos
de papel, para a dispersão
dos vocativos. Eu queria estar mais contente
se soubesse haver razões para isso,
depor-te a aporia destes dias
e trabalhar com novas certezas.
Em vez disso skaters faíscam
no centro da minha passagem, no meio
da minha vida
e a sua navegabilidade incondicional
desliza nesta aspereza da retina.
E isto é classe média: o cancro
como solução final; um fecho de braguilha
não esconde o faro latejante dos cães,
a trovoada latente.
Sou o homem do tempo, sou o homem do tempo.
Ando a tentar segurar este grande
aguaceiro que previ, de capote ando
a tentar pospor o optativo
porque na boca levo o gosto do desgosto
e tão sensíveis as papilas ao seu gosto.
Sou o homem do tempo, sou o homem do tempo.
Nem um verbo me move
desta irredutibilidade em desejar.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
A falta saliente
Obstinadamente invisto contra uma corrente contrária
que obstinada investe contra mim uma musa
de saliente fala. Libertar-me bem queria mas não sei
se o medo se a circunstância se a melancolia
me treme quando só o lance resolvia, me limita
quando a imensidão pedia, me oxida o aço à porfia.
Tudo à volta me comprime numa mesquinha condição
e O’Neill às vezes não existem teu machado de língua afiada,
tuas ensinadas varinas de sinuosas varizes,
tuas empenadas narinas de empinados narizes,
às vezes O’Neill é só o vazio e suas raízes.
Obstinadamente busco um país que me maravilhe,
um país de maravilhas. Não esta portugalice do ali borda-se,
gato à janela, lindo postal, calçadas e motivos, velhos desdentes,
sim sim, já agora, num sei, sei lá, pois bem, já cá não mora.
Obstinadamente busco um país sem história para contar;
confiar que haverá uma mesa e um lugar
onde se perspectivem coisas depois do dia oblongo e da cidadela
tomada; essa mesa e esse lugar nem sequer meus.
Busco qualquer coisa outra coisa que não esse, isso. Busco
a tépida esfera, a plúmbea fonte ou afundar os dedos
num sôfrego e talvez abster-me na insistência
quando a dúvida fosse um sólido na tua cabeça
e já não houvesse tampões para o horror,
talvez sim então sim talvez abster-me.
Os teus poetas não me valem,
os teus poetas não se lhes dá que eu morra.
E esta pluma é um xamã que arde sem se ver
na mandíbula dorida de apertar a palavra,
inexistente sílaba da oclusão. Se houvesse
uma goteira a preservar da noite o cerrar do livro!
Se houvesse maneira de não morrer!
Insisto obstinada e dementemente busco um país.
Esqueço-me da corrente que acomete, falha a previsão
é um fusível, um grifo alcandorado nos cabos de alta tensão.
Penas pesadas as dos mitómanos: serem investidos
numa sociedade sem grifos
onde galifões beijam com saliva viperina
o lábio rubro do inocente efebo
e lambuzam a mordiscadela posterior
com desvelo clínico e libações ordinárias.
Este é o teu país O’Neill, que destrói as ondas e as praias
e descura feridas individuais de beijos sociais,
o mensageiro do amor que as vagas tala
a trazer-te a proposta disjuntiva sem saída:
se a cana do nariz intacta
então a cana de pesca partida.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
que obstinada investe contra mim uma musa
de saliente fala. Libertar-me bem queria mas não sei
se o medo se a circunstância se a melancolia
me treme quando só o lance resolvia, me limita
quando a imensidão pedia, me oxida o aço à porfia.
Tudo à volta me comprime numa mesquinha condição
e O’Neill às vezes não existem teu machado de língua afiada,
tuas ensinadas varinas de sinuosas varizes,
tuas empenadas narinas de empinados narizes,
às vezes O’Neill é só o vazio e suas raízes.
Obstinadamente busco um país que me maravilhe,
um país de maravilhas. Não esta portugalice do ali borda-se,
gato à janela, lindo postal, calçadas e motivos, velhos desdentes,
sim sim, já agora, num sei, sei lá, pois bem, já cá não mora.
Obstinadamente busco um país sem história para contar;
confiar que haverá uma mesa e um lugar
onde se perspectivem coisas depois do dia oblongo e da cidadela
tomada; essa mesa e esse lugar nem sequer meus.
Busco qualquer coisa outra coisa que não esse, isso. Busco
a tépida esfera, a plúmbea fonte ou afundar os dedos
num sôfrego e talvez abster-me na insistência
quando a dúvida fosse um sólido na tua cabeça
e já não houvesse tampões para o horror,
talvez sim então sim talvez abster-me.
Os teus poetas não me valem,
os teus poetas não se lhes dá que eu morra.
E esta pluma é um xamã que arde sem se ver
na mandíbula dorida de apertar a palavra,
inexistente sílaba da oclusão. Se houvesse
uma goteira a preservar da noite o cerrar do livro!
Se houvesse maneira de não morrer!
Insisto obstinada e dementemente busco um país.
Esqueço-me da corrente que acomete, falha a previsão
é um fusível, um grifo alcandorado nos cabos de alta tensão.
Penas pesadas as dos mitómanos: serem investidos
numa sociedade sem grifos
onde galifões beijam com saliva viperina
o lábio rubro do inocente efebo
e lambuzam a mordiscadela posterior
com desvelo clínico e libações ordinárias.
Este é o teu país O’Neill, que destrói as ondas e as praias
e descura feridas individuais de beijos sociais,
o mensageiro do amor que as vagas tala
a trazer-te a proposta disjuntiva sem saída:
se a cana do nariz intacta
então a cana de pesca partida.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Psicodrama
Duas vezes que falhei de nem sequer tentar.
Duas vezes que tentei de nem sequer falhar.
Partido como um bolo de resto de festa, um resto de festa,
um resto de bolo partido, triste e seco
para uso fácil de sonolenta e derradeira graçola
como se eu fosse de atirar e ser usado, como se eu fosse ocasião
para derradeira partida, antes de partir.
Lento resto
como um insistente projecto, um lembrete
obstruente, uma porção que se deixou porque se não quis,
ou então se esqueceu porque os olhos já tardam
e apenas resta o miúdo mal comportado de jantares filantrópicos
ou o velho sebento pontual em intervalos de escola,
o agrafo falhado, aquele que fica a olhar imbecilmente
para as coisas, a aberração do circo vitoriano,
a aberração sobre a qual se fecha a luz à noite
depois de escoados os visitantes
e findo o dia da visita
que atrás de si deixou um chão imundo
e um silêncio de esquinas esquivas e deprimidas.
Este ter de durar pela bateria.
Este ter de durar até um dia.
O fardo desta quietude eterna, disse Keats, mas esta morte
tão movível, esta morte bicho espectacular
de patas de veludo e um focinho que revolve
na terra o cuspo da alma
e lhe extrai vértebras e minérios.
Ou o grande mamífero marinho, o rei branco do norte
rasgando-nos as carnes num sorvedouro:
o sistema é uma máquina de matar.
Este ter que arcar com o mundo,
um mísero atlético levando aos ombros os ombros de Atlas,
carregando tudo quem nada é,
carregando variações, acelerações, má mecânica,
a influência astral
no que é super-mecanismo, má sina
no que é matemática. Ou então, já quando não a espero,
a Razão entra-me pela casa contrita e esquálida
como uma razão pródiga, emocional.
Anuncia-me noivado com um tal Ímpeto
e eu fico a olhá-la a recordar-me
de quando era razão sólida e prometedora
e fazia calar os tabernáculos com as suas alegorias
e as suas digressões e vestia roupa modesta e apropriada.
Eu gostava desta minha filha Razão.
Agora não. Agora ela vai-se e outro gostará mais dela
assim, sem mim, ou comigo à parte.
Triste pai sem razão. Lear temporão e patético. Outono do mundo.
Ou figura de urso.
Eu sou a estação que vem com pressa e sai dos primeiros comboios
e instala nas cidades a sua opacidade cris. Eu sou a patrulha da lua,
a lânguida reza que o vagabundo faz a lojas de retrosaria
no seu curso compassado e sem destino
de sacas e alinhavos.
Eu sou o que não sou.
Como um poeta romântico no hospício do céu,
um ferreiro que na fornalha de Hefesto malhasse os versos,
estrelas, a trovoada no Cáucaso, os bíceps a Ájax,
ou um maço que visse numa cornija o bico do gavião
persigo essa insalubridade nos fenómenos
detendo-me nos espigões hebetados o passeio do dedo,
receando o contacto com nóveis musas. Oh, abjuro a musa
por tudo o que ela me fez de mal!
- Oh, sim! esquece essa Júlia que te amolgou o coração
e aceita o grande deus surdo
do cimento, deus tocável e concreto
- que o cimento ganhou formas com que a forma não contava,
o cimento reina solo.
Este teimar na desproporção ou este crónico desapego:
puxar atlânticos com o músculo de uma ideia,
ou como um caterpillar a derribar casas de bonecas
pôr na miudez o tanto,
exagerado no excesso e no defeito
concentrando um física imoderada no meu pequeno mundo
como se esperasse ser surpreendido pelas coisas
e não esperasse senão a surpresa.
Ou então não. Ser simplesmente mal usado.
Eu que podia ter sido tão mais e fui tão menos.
Eu que por momentos descalço as mitenes
e retiro o gorro, tiara de vagabundos,
e permito que o sol me beije a pele curtida
segunda vez.
Eu sei lá.
Se eu fosse ponte o rio secaria.
Se eu fosse antílope o leão enjoaria.
Se eu fosse Társis Nínive floresceria.
Fosse o que fosse que eu fosse
a tristeza cravaria as suas garras de tristeza
como um ancinho afiado
na terra
queimando e salgando tudo em volta
como uma peste infernal apossando-se das raízes.
Daí que eu seja um mal que só se possa cortar pela raiz.
Ou nem isso. Talvez mal não haja, mau não seja:
apenas pura tristeza.
Ó deuses, é isto a seretonina, ou quê?
Ponho a mão do lado direito
da face: tapo um olho
e não é metade o que vejo
nem reduzo a tristeza a seja o que for.
E se descruzo as pernas e as volto a cruzar
não muda em nada a minha condição
porque apenas transito o físico da dor
e não a dor em si mesma
se é que se pode pôr as coisas assim.
Vou folheando o meu livro de horas
à procura de luz nas palavras: não há luz
nas palavras.
É. Talvez seja da luz, talvez seja de lá.
Acendo o gás de cerveja:
ascenderá.
Penso se há gema que tenha regresssado ao ovo;
não sei, sei lá.
A empregada passa e veste de preto,
há gente que passa e a gente passa o preto,
vou a tomar do meu café e me parece mais preto,
tento aclarar as ideias: a gerência é curdistanesa
e tisnados todos os seus movimentos;
digo: não pode ser:
e redentora lá está a televisão
com o clarão do jogo de hóquei no gelo
(procuro mais uma obsessão no frio
mas dou-me descanso e não me incomodo);
entro de novo (não é que tivesse saído),
entro e saio como uma corrente de ar,
entro e saio no que posso sem perguntar,
esfrego os pulsos entre si e penso
que se ao menos como um castor ali erigisse meu dique!...
A diurese lembra-me de mim:
mijo e perscruto no escroto quem sou
(fecho o fecho, lavo-me nas mãos
a água fria, volto a sentar-me),
as minhas costelas em braille
não são leitura para ninguém
e nos dedos os dias como dias que vieram
de outros dedos de outros dias.
Com o ápice da língua embotado lambo
agulhas,
a concatenação de unhas.
E o sono é de acrílico: um enorme bicho transparente
de matéria sintética e espirros de tinta preta
e um fémur intenso e um rádio frenético.
Olho pela janela cansada - vontade de a defenestrar!
O estado da insónia é uma transição
entre o mundo dos mortos e o dos corpos incorruptos
- pelo menos é o que me apetece dizer.
A raíz de cimento do meu canto insone
um caule encaniçado
doravante outrora
e os pulsos calafetados de um tentamen falhado
e uma enfermaria acordada
- toda a minha escrita uma enfermaria acordada.
E o inverno há-de chegar
carregado, tisnado
como um códice ou um livro de termos,
o inverno há-de chegar, o inverno há-de chegar
à psicologia frívola e à de altas temperaturas.
Até a Laodiceia há-de chegar, a tudo este inverno há-de chegar:
ao colibri e ao collant.
É já cansado de escrever que vejo
esta irmandade de ovelhas
ou um aeroporto estrénuo
ou um morcego ressacado que acorda
num estremunhar de asas.
É já cansado de escrever que me deixo entrar
nos paraísos dos torniquetes enferrujados,
na tectónica tensão
e aí esqueço nos colarinhos de gabardina
as quilhas de grandes navios
e o útero medonho,
cicatriz que se cobre com um lenço.
Eu que conhecia a solidão
conheço-lhe agora o plantão.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Duas vezes que tentei de nem sequer falhar.
Partido como um bolo de resto de festa, um resto de festa,
um resto de bolo partido, triste e seco
para uso fácil de sonolenta e derradeira graçola
como se eu fosse de atirar e ser usado, como se eu fosse ocasião
para derradeira partida, antes de partir.
Lento resto
como um insistente projecto, um lembrete
obstruente, uma porção que se deixou porque se não quis,
ou então se esqueceu porque os olhos já tardam
e apenas resta o miúdo mal comportado de jantares filantrópicos
ou o velho sebento pontual em intervalos de escola,
o agrafo falhado, aquele que fica a olhar imbecilmente
para as coisas, a aberração do circo vitoriano,
a aberração sobre a qual se fecha a luz à noite
depois de escoados os visitantes
e findo o dia da visita
que atrás de si deixou um chão imundo
e um silêncio de esquinas esquivas e deprimidas.
Este ter de durar pela bateria.
Este ter de durar até um dia.
O fardo desta quietude eterna, disse Keats, mas esta morte
tão movível, esta morte bicho espectacular
de patas de veludo e um focinho que revolve
na terra o cuspo da alma
e lhe extrai vértebras e minérios.
Ou o grande mamífero marinho, o rei branco do norte
rasgando-nos as carnes num sorvedouro:
o sistema é uma máquina de matar.
Este ter que arcar com o mundo,
um mísero atlético levando aos ombros os ombros de Atlas,
carregando tudo quem nada é,
carregando variações, acelerações, má mecânica,
a influência astral
no que é super-mecanismo, má sina
no que é matemática. Ou então, já quando não a espero,
a Razão entra-me pela casa contrita e esquálida
como uma razão pródiga, emocional.
Anuncia-me noivado com um tal Ímpeto
e eu fico a olhá-la a recordar-me
de quando era razão sólida e prometedora
e fazia calar os tabernáculos com as suas alegorias
e as suas digressões e vestia roupa modesta e apropriada.
Eu gostava desta minha filha Razão.
Agora não. Agora ela vai-se e outro gostará mais dela
assim, sem mim, ou comigo à parte.
Triste pai sem razão. Lear temporão e patético. Outono do mundo.
Ou figura de urso.
Eu sou a estação que vem com pressa e sai dos primeiros comboios
e instala nas cidades a sua opacidade cris. Eu sou a patrulha da lua,
a lânguida reza que o vagabundo faz a lojas de retrosaria
no seu curso compassado e sem destino
de sacas e alinhavos.
Eu sou o que não sou.
Como um poeta romântico no hospício do céu,
um ferreiro que na fornalha de Hefesto malhasse os versos,
estrelas, a trovoada no Cáucaso, os bíceps a Ájax,
ou um maço que visse numa cornija o bico do gavião
persigo essa insalubridade nos fenómenos
detendo-me nos espigões hebetados o passeio do dedo,
receando o contacto com nóveis musas. Oh, abjuro a musa
por tudo o que ela me fez de mal!
- Oh, sim! esquece essa Júlia que te amolgou o coração
e aceita o grande deus surdo
do cimento, deus tocável e concreto
- que o cimento ganhou formas com que a forma não contava,
o cimento reina solo.
Este teimar na desproporção ou este crónico desapego:
puxar atlânticos com o músculo de uma ideia,
ou como um caterpillar a derribar casas de bonecas
pôr na miudez o tanto,
exagerado no excesso e no defeito
concentrando um física imoderada no meu pequeno mundo
como se esperasse ser surpreendido pelas coisas
e não esperasse senão a surpresa.
Ou então não. Ser simplesmente mal usado.
Eu que podia ter sido tão mais e fui tão menos.
Eu que por momentos descalço as mitenes
e retiro o gorro, tiara de vagabundos,
e permito que o sol me beije a pele curtida
segunda vez.
Eu sei lá.
Se eu fosse ponte o rio secaria.
Se eu fosse antílope o leão enjoaria.
Se eu fosse Társis Nínive floresceria.
Fosse o que fosse que eu fosse
a tristeza cravaria as suas garras de tristeza
como um ancinho afiado
na terra
queimando e salgando tudo em volta
como uma peste infernal apossando-se das raízes.
Daí que eu seja um mal que só se possa cortar pela raiz.
Ou nem isso. Talvez mal não haja, mau não seja:
apenas pura tristeza.
Ó deuses, é isto a seretonina, ou quê?
Ponho a mão do lado direito
da face: tapo um olho
e não é metade o que vejo
nem reduzo a tristeza a seja o que for.
E se descruzo as pernas e as volto a cruzar
não muda em nada a minha condição
porque apenas transito o físico da dor
e não a dor em si mesma
se é que se pode pôr as coisas assim.
Vou folheando o meu livro de horas
à procura de luz nas palavras: não há luz
nas palavras.
É. Talvez seja da luz, talvez seja de lá.
Acendo o gás de cerveja:
ascenderá.
Penso se há gema que tenha regresssado ao ovo;
não sei, sei lá.
A empregada passa e veste de preto,
há gente que passa e a gente passa o preto,
vou a tomar do meu café e me parece mais preto,
tento aclarar as ideias: a gerência é curdistanesa
e tisnados todos os seus movimentos;
digo: não pode ser:
e redentora lá está a televisão
com o clarão do jogo de hóquei no gelo
(procuro mais uma obsessão no frio
mas dou-me descanso e não me incomodo);
entro de novo (não é que tivesse saído),
entro e saio como uma corrente de ar,
entro e saio no que posso sem perguntar,
esfrego os pulsos entre si e penso
que se ao menos como um castor ali erigisse meu dique!...
A diurese lembra-me de mim:
mijo e perscruto no escroto quem sou
(fecho o fecho, lavo-me nas mãos
a água fria, volto a sentar-me),
as minhas costelas em braille
não são leitura para ninguém
e nos dedos os dias como dias que vieram
de outros dedos de outros dias.
Com o ápice da língua embotado lambo
agulhas,
a concatenação de unhas.
E o sono é de acrílico: um enorme bicho transparente
de matéria sintética e espirros de tinta preta
e um fémur intenso e um rádio frenético.
Olho pela janela cansada - vontade de a defenestrar!
O estado da insónia é uma transição
entre o mundo dos mortos e o dos corpos incorruptos
- pelo menos é o que me apetece dizer.
A raíz de cimento do meu canto insone
um caule encaniçado
doravante outrora
e os pulsos calafetados de um tentamen falhado
e uma enfermaria acordada
- toda a minha escrita uma enfermaria acordada.
E o inverno há-de chegar
carregado, tisnado
como um códice ou um livro de termos,
o inverno há-de chegar, o inverno há-de chegar
à psicologia frívola e à de altas temperaturas.
Até a Laodiceia há-de chegar, a tudo este inverno há-de chegar:
ao colibri e ao collant.
É já cansado de escrever que vejo
esta irmandade de ovelhas
ou um aeroporto estrénuo
ou um morcego ressacado que acorda
num estremunhar de asas.
É já cansado de escrever que me deixo entrar
nos paraísos dos torniquetes enferrujados,
na tectónica tensão
e aí esqueço nos colarinhos de gabardina
as quilhas de grandes navios
e o útero medonho,
cicatriz que se cobre com um lenço.
Eu que conhecia a solidão
conheço-lhe agora o plantão.
Daniel Jonas
Os Fantasmas Inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Elementário
O verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em falar do que não pode ser dito a quem
se quer dizer
ou o verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em não falar do que pode ser dito a quem
se quer dizer
ou o verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em não falar do que não pode ser dito a quem
se quer dizer
ou o verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em falar do que pode ser dito a quem
se não quer dizer
isto, claro, partindo do princípio
de que há um sentido das palavras,
verdadeiro, um poema e um
a quem se queira dizer.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
é que o poema consiste
em falar do que não pode ser dito a quem
se quer dizer
ou o verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em não falar do que pode ser dito a quem
se quer dizer
ou o verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em não falar do que não pode ser dito a quem
se quer dizer
ou o verdadeiro sentido das palavras
é que o poema consiste
em falar do que pode ser dito a quem
se não quer dizer
isto, claro, partindo do princípio
de que há um sentido das palavras,
verdadeiro, um poema e um
a quem se queira dizer.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
O meu poema teve um esgotamento nervoso.
Já não suporta mais as palavras.
Diz às palavras: palavras
ide embora,
ide procurar outro poema
onde habitar.
O meu poema tem destas coisas
de vez em quando.
Posso vê-lo: ali distendido
em cama de linho muito branco
sem perspectivas ou desejo
quedando-se num silêncio
pálido
como um poema clorótico.
Pergunto-lhe: posso fazer alguma coisa por ti?
mas apenas me fixa o olhar;
fica ali a fitar-me de olhos vazios
e boca seca.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Já não suporta mais as palavras.
Diz às palavras: palavras
ide embora,
ide procurar outro poema
onde habitar.
O meu poema tem destas coisas
de vez em quando.
Posso vê-lo: ali distendido
em cama de linho muito branco
sem perspectivas ou desejo
quedando-se num silêncio
pálido
como um poema clorótico.
Pergunto-lhe: posso fazer alguma coisa por ti?
mas apenas me fixa o olhar;
fica ali a fitar-me de olhos vazios
e boca seca.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Grotto
Não quero nada claro ou helénico.
Prefiro turbinas de aviões comerciais, a sua fuligem
doméstica
às velas de alabastro do veleiro de Ulisses
lá em alto mar.
Prefiro o eclipse a Calipso.
Não quero nada de verdadeiramente branco.
Dispenso a asa delta de garças,
o seu voo aerodinâmico,
troco-o pela arribação de ratos no esgoto,
a sua pressa chinesa,
o seu stress pós-traumático:
orgulham-me criaturas tão limpas.
Assim também recuso o papel branco:
trato de o desfigurar
com sangue negro, como se desfigura
um branco no Harlem.
Nem quero começar a imaginar como se sentiriam
escravos nos campos de algodão.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Prefiro turbinas de aviões comerciais, a sua fuligem
doméstica
às velas de alabastro do veleiro de Ulisses
lá em alto mar.
Prefiro o eclipse a Calipso.
Não quero nada de verdadeiramente branco.
Dispenso a asa delta de garças,
o seu voo aerodinâmico,
troco-o pela arribação de ratos no esgoto,
a sua pressa chinesa,
o seu stress pós-traumático:
orgulham-me criaturas tão limpas.
Assim também recuso o papel branco:
trato de o desfigurar
com sangue negro, como se desfigura
um branco no Harlem.
Nem quero começar a imaginar como se sentiriam
escravos nos campos de algodão.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Se as crianças me perguntarem o que quero
respondo quero morrer.
Como a sibila de Cumas se as crianças
me perguntarem o que estás aí a fazer
baloiçando nessa garrafa suspensa
respondo quero morrer.
Nesta garrafa suspensa baloiçando no ar
desgrenhado, com o peito arfante e o coração
a rebentar de fúria selvagem
se as crianças me perguntarem
o que estás aí a fazer, o que quero
respondo quero morrer.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
respondo quero morrer.
Como a sibila de Cumas se as crianças
me perguntarem o que estás aí a fazer
baloiçando nessa garrafa suspensa
respondo quero morrer.
Nesta garrafa suspensa baloiçando no ar
desgrenhado, com o peito arfante e o coração
a rebentar de fúria selvagem
se as crianças me perguntarem
o que estás aí a fazer, o que quero
respondo quero morrer.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
Já não é possível enrolar mais esta erva
Já não é possível enrolar mais esta erva
nos teus dedos;
os teus dedos
já não tocam o nervo da noite
e o fumo violento
que inalas a desinfestar a alma
faz-te vagarosa beleza.
O anzol circular que o teu lábio mordeu,
paixão de peixes,
quer morder o meu
aço. A erva quer ser lua
na crescente inclinação rente.
Eu não quero ser nada.
E está frio, mas não menciono nenhum mês
como o fazem os poetas.
Duas belas balas medem
o calibre dos meus olhos. Cindo nos dedos
outros dedos contorcidos:
o gás é nosso amigo.
Não há grilos na hesitação
do silêncio. Não há mortais desembainhando
navalhas. Hoje longa hespéria
te espero
e assim como um torpor te entro
como fumo
nos pulmões.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
nos teus dedos;
os teus dedos
já não tocam o nervo da noite
e o fumo violento
que inalas a desinfestar a alma
faz-te vagarosa beleza.
O anzol circular que o teu lábio mordeu,
paixão de peixes,
quer morder o meu
aço. A erva quer ser lua
na crescente inclinação rente.
Eu não quero ser nada.
E está frio, mas não menciono nenhum mês
como o fazem os poetas.
Duas belas balas medem
o calibre dos meus olhos. Cindo nos dedos
outros dedos contorcidos:
o gás é nosso amigo.
Não há grilos na hesitação
do silêncio. Não há mortais desembainhando
navalhas. Hoje longa hespéria
te espero
e assim como um torpor te entro
como fumo
nos pulmões.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
COMO UM METALÚRGICO DA LUÍSNAVA,
Que uma musa metálica redime
E faz dum vulcão cama e os lençóis lava,
Soldo a métrica, malho p´ra que rime.
Toco a afiada lira, tanjo o meu aço,
Na homérica bigorna chispa e liça.
Silvam sereias, chamam-me ao regaço.
Ítaca estanca a dor, Ática atiça-a.
Como operário do verso blindo a nave
Que ao leme outro almirante levará;
Levo-me a mim à vela, o argueiro é trave:
Neste solo outro mastro cantará.
E se o cálamo às vezes carpe as bulhas
Das carúnculas saem-me faúlhas.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Que uma musa metálica redime
E faz dum vulcão cama e os lençóis lava,
Soldo a métrica, malho p´ra que rime.
Toco a afiada lira, tanjo o meu aço,
Na homérica bigorna chispa e liça.
Silvam sereias, chamam-me ao regaço.
Ítaca estanca a dor, Ática atiça-a.
Como operário do verso blindo a nave
Que ao leme outro almirante levará;
Levo-me a mim à vela, o argueiro é trave:
Neste solo outro mastro cantará.
E se o cálamo às vezes carpe as bulhas
Das carúnculas saem-me faúlhas.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Na FLOR DA TUA IDADE TAL O ORGULHO
Que a mulher imune a tenra idade
Não vem, terrena força, a castidade
Manchar-te, virgem, deste imundo entulho.
Absorto, nessa sombra da virtude
Ensombras tua mãe ( como ela bela)
E lembras o teu pai (mais belo que ela),
Donzela que ele foi, conquanto rude.
És limpa como o sol, da torre guarda-te,
De aríete protege-te, és a esperança
De todos nós, fiel desta balança
Que nada pesa (quanto pesa o céu?) .
Com graça e couro cinge os lombos, farda-te:
Por elmo a alma, por viseira o céu.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Que a mulher imune a tenra idade
Não vem, terrena força, a castidade
Manchar-te, virgem, deste imundo entulho.
Absorto, nessa sombra da virtude
Ensombras tua mãe ( como ela bela)
E lembras o teu pai (mais belo que ela),
Donzela que ele foi, conquanto rude.
És limpa como o sol, da torre guarda-te,
De aríete protege-te, és a esperança
De todos nós, fiel desta balança
Que nada pesa (quanto pesa o céu?) .
Com graça e couro cinge os lombos, farda-te:
Por elmo a alma, por viseira o céu.
Daniel Jonas
Sonótono
Livros Cotovia, 2007
Anho de deus
A dor tende ao silêncio: para quê
contar a tortura
se ela mesmo nos venda a língua
para a paz?
Assim com este cabrito: torturado
e silenciosamente
servido na paz muda deste almoço
de família.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
contar a tortura
se ela mesmo nos venda a língua
para a paz?
Assim com este cabrito: torturado
e silenciosamente
servido na paz muda deste almoço
de família.
Daniel Jonas
Os fantasmas inquilinos
Livros Cotovia, 2005
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