Mostrar mensagens com a etiqueta octavio paz. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta octavio paz. Mostrar todas as mensagens

Dizer, fazer

Entre o que vejo e digo,
Entre o que digo e calo,
Entre o que calo e sonho,
Entre o que sonho e olvido
A poesia.
Desliza entre o sim e o não:
diz
o que calo,
cala
o que digo,
sonha
o que olvido.
Não é um dizer,
mas um fazer.
Um fazer
que é um dizer.
A poesia
diz-se e ouve-se,
é real.
E mal eu digo
é real,
dissipa-se.
É mais real assim?
Ideia palpável,
verbo
impalpável,
a poesia
vai e vem
entre o que é
e o que não é.
Tece reflexos
e destece.
A poesia
semeia olhos na página,
semeia palavras nos olhos.
Os olhos falam,
as palavras olham,
os olhares pensam.
Ouvir
o pensamento,
ver
o que dizemos,
tocar
o corpo
da ideia.
Os olhos
fecham-se.
Abrem-se as palavras.


Octavio Paz
Tradução A.M.

As palavras

Vira-as,
pega-as pelo rabo (chiai, putas),
açoita-as,
adoça-lhes a boca às reguilas,
enche-as, balões, pica-as,
chupa-lhes sangue e tutano,
seca-as,
capa-as,
pisa-as, galo galante,
torce-lhes o gasganete, cozinheiro,
depena-as,
estripa-as, toiro,
boi, arrasta-as,
fá-las, poeta,
faz que se traguem todas as tuas palavras.


Octavio Paz

Tradução A.M.

os noivos / octavio paz

Deitados na erva
uma rapariga e um rapaz.
Comem laranjas, trocam beijos
como as ondas trocam suas espumas.

Deitados na praia
uma rapariga e um rapaz.
Comem limões, trocam beijos
como as nuvens trocam suas espumas.

Deitados sob a terra
uma rapariga e um rapaz.
Não dizem nada, não se beijam,
trocam silêncio por silêncio.

Octavio Paz
Antologia Poética
Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1998