Quando me perguntam a causa do meu amor
eu nunca respondo: Sua grande beleza, já a conheceis.
(E depois é possível que haja rostos mais lindos).
Nem tão pouco descrevo as qualidades certas do seu espírito,
que punha à mostra com seus gestos
ou na disposição ao silêncio ou ao sorriso
conforme o pedido do meu segredo.
Eram coisas da alma e dela nada disse.
(Aliás, devia acrescentar que conheci almas superiores).
A verdade do meu amor agora a sei:
sua presença vencia a humana imperfeição,
pois é terrível pensar
que não dizem em nós os corpos com as almas,
assim cegando os corpos a graça do espírito,
sua claridade, a dorida flor da experiência,
a própria bondade.
Coisas importantes que nunca descobrimos
ou descobrimos tarde.
Mentem os corpos, outras vezes, um calor airoso,
movida luz, frescura profunda;
e o mal mostra-nos sua seca falsidade.
A verdade do meu amor sabei-la agora:
a matéria e o sopro uniram-se em sua vida
tal como a luz que pousa no espelho
(pequena luz, espelho diminuto);
era desgraçada criação perfeita.
Um ser em ordem crescia a meu lado
e serenava minha desordem.
Eu amava a sua limitada perfeição.
Francisco Brines
Tradução A.M.
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Os prazeres inferiores
Não desdenhes as paixões vulgares.
Tens os anos precisos para saber
que elas correspondem exactamente à vida.
Não reduzas a sua acção,
pois se as subtrais
do breve tempo em que consistes
é ainda mais falho o existir.
Descobre sua verdade por trás da aparência
e assim não haverá falsidade,
nem poderás mentir que foi razão de vida
o que foi apenas trânsito.
Mas pouparam-te elas o fiel aborrecimento das horas.
Exigem lucidez, não em sua experiência,
mas em seu escasso ser;
valora-as exactas,
para o que tens de saber o que a vida vale
e essa sabedoria há muito que é tua.
Se te enganares a medi-las,
fá-lo sempre por defeito.
Nunca melhores o que vale pouco.
E que não tenham nome, nem tempo possuído,
e fiquem confundidas em sua promiscuidade.
Sabes que a memória é fraca e te ajuda.
Todas são uma só,
como uma só é a vida.
E as outras paixões, dignas de um nome
e do refúgio do tempo,
mantém-nas longe delas,
que te lembrem sempre o que a vida não é.
E agradece à vida esses erros.
Francisco Brines
Insistencias en Luzbel
Tradução A.M.
Tens os anos precisos para saber
que elas correspondem exactamente à vida.
Não reduzas a sua acção,
pois se as subtrais
do breve tempo em que consistes
é ainda mais falho o existir.
Descobre sua verdade por trás da aparência
e assim não haverá falsidade,
nem poderás mentir que foi razão de vida
o que foi apenas trânsito.
Mas pouparam-te elas o fiel aborrecimento das horas.
Exigem lucidez, não em sua experiência,
mas em seu escasso ser;
valora-as exactas,
para o que tens de saber o que a vida vale
e essa sabedoria há muito que é tua.
Se te enganares a medi-las,
fá-lo sempre por defeito.
Nunca melhores o que vale pouco.
E que não tenham nome, nem tempo possuído,
e fiquem confundidas em sua promiscuidade.
Sabes que a memória é fraca e te ajuda.
Todas são uma só,
como uma só é a vida.
E as outras paixões, dignas de um nome
e do refúgio do tempo,
mantém-nas longe delas,
que te lembrem sempre o que a vida não é.
E agradece à vida esses erros.
Francisco Brines
Insistencias en Luzbel
Tradução A.M.
Apontamento de viagem
(De automóvel)
As janelas reflectem o fogo do poente
e flutua uma luz cínzea que chegou do mar.
Quer ficar dentro de mim o dia que agoniza
como se eu, ao fitá-lo, o pudesse salvar.
E quem há que me olhe e que possa salvar-me?
A luz tornou-se negra e apagou-se o mar.
Francisco Brines
A Última Costa
Assírio & Alvim, 1997
Tradução de José Bento
e flutua uma luz cínzea que chegou do mar.
Quer ficar dentro de mim o dia que agoniza
como se eu, ao fitá-lo, o pudesse salvar.
E quem há que me olhe e que possa salvar-me?
A luz tornou-se negra e apagou-se o mar.
Francisco Brines
A Última Costa
Assírio & Alvim, 1997
Tradução de José Bento
Aquele verão da minha juventude
E que é que ficou daquele verão antigo
nas costas da Grécia?
Que resta em mim do único verão da minha vida?
Se eu pudesse escolher de quanto vivi
algum lugar e o tempo que o prende,
a sua milagrosa companhia é para ali que me arrasta,
onde ser feliz era a natural razão de estar com vida.
Perdura a experiência, como um quarto fechado da infância;
não resta já a lembrança de dias sucessivos
nesta sucessão medíocre dos anos.
Hoje vivo esta carência,
e apuro do engano algum resgate
que me permita olhar ainda o mundo
com amor necessário;
e assim saber-me digno do sonho da vida.
De quanto foi ventura, desse lugar de fortuna,
tomo avaramente
sempre uma mesma imagem:
seus cabelos movidos pelo vento
e o olhar fixo dentro do mar.
Apenas esse momento indiferente.
Selada nele, a vida.
Francisco Brines
Tradução A.M.
nas costas da Grécia?
Que resta em mim do único verão da minha vida?
Se eu pudesse escolher de quanto vivi
algum lugar e o tempo que o prende,
a sua milagrosa companhia é para ali que me arrasta,
onde ser feliz era a natural razão de estar com vida.
Perdura a experiência, como um quarto fechado da infância;
não resta já a lembrança de dias sucessivos
nesta sucessão medíocre dos anos.
Hoje vivo esta carência,
e apuro do engano algum resgate
que me permita olhar ainda o mundo
com amor necessário;
e assim saber-me digno do sonho da vida.
De quanto foi ventura, desse lugar de fortuna,
tomo avaramente
sempre uma mesma imagem:
seus cabelos movidos pelo vento
e o olhar fixo dentro do mar.
Apenas esse momento indiferente.
Selada nele, a vida.
Francisco Brines
Tradução A.M.
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