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Blaise Cendrars





Blaise Cendrars, pseudónimo de Fréderic-Louis Sauser, nasceu em La Chaux-de-Fonds, cantão de Neuchâtel, Suíça,  a 1 de Setembro de 1887, tendo falecido em Paris a 21 de Janeiro de 1961. 
Novelista e poeta suíço, é o retrato do eterno viajante que reflecte em toda a sua poesia. Viveu em São Petersburgo, Nova Iorque, Londres, Paris, etc. Cendrars viajou ao longo de toda a sua vida e, numa dessas viagens, em 1920, visita o Brasil, onde é bastante influenciado por inúmeros artistas e escritores do modernismo brasileiro, entre os quais Oswald de Andrade, com cujos poemas da Poesia Pau-Brasil, e os seus poemas mais curtos, de construção cubista, apresentam forte semelhança formal e é implícito o desejo pelo rudimentar. Nessa incursão, interessou-se igualmente pelos índios do Brasil, sobre os quais escreveu diversos artigos em jornais.
Não obstante ter colaborado na revista "Portugal Futurista", de ter traduzido para francês “A Selva”, de Ferreira de Castro,  e de ter passado também por Portugal, foi até recentemente praticamente ignorado neste rectângulo de água estagnada.
Além de poeta e novelista, Cendrars foi crítico e fundador de algumas inovadoras revistas.
Paul Éluard considerou-o um dos grandes poetas do século XX, e muitos colam o nome de Cendrars a Allen Ginsberg, muito devido aos poemas longos e prosaicos, que o segundo também viria a adoptar, apontando-o como uma das referências do poeta norte-americano - uma das principais figuras da apelidada geração-beat.


Dados cronológicos:


1887. 1 de Setembro. Às 19 e 45 nasce em Chaux-de-Fonds (Suíça), no nº27 da Rue de la Paix, Fréderic-Louis Sauser, que usará o pseudónimo de Blaise Cendrars. Note-se que os seus primeiros «escritos» são assinados por Freddy Sausey, como o atestam vários papéis e cadernos inéditos compilados por Miriam Cendrars. 
Era filho de Georges-Fréderic Sauser e de Marie-Louise Donner, ambos suíços.


1887/1916. O pai, homem de negócios, gastrónomo e grande bebedor, arrasta a família de terra em terra. O Egipto, a Inglaterra e outros países fornecerão mais tarde abundante material poético a B.C.


1896. Aluno duma escola alemã.


1902. Para o castigar de inúmeros escândalos e dívidas contraídas em Neuchâtel, o pai fecha-o num quarto. B. C. foge pela janela depois de se ter apoderado de várias centenas de francos da mãe e dos cigarros do pai.


1902/1903. Acompanha a Moscovo um pacato representante de relojoaria, que o poeta «transformará» no fabuloso Rogovine, vendedor de pedras preciosas. Durante três anos visita duas vezes a China e uma vez a América.


1906. Um caderno desta época, situa-o em S.Petersburgo. Correspondente dum banco (domina perfeitamente o francês e o alemão), leva uma vida quase miserável. Mas nada o impede de declarar, ao evocar esses tempos, que ganhara já o primeiro milhão.


1907. Em Abril encontra-se em Neuchâtel junto dos pais. Alguns meses antes apaixonara-se por Hélène, que morre tragicamente queimada.
Na última linha dum caderno deste ano Freddy Sauseu escreve: je crache sur la vie que n´écoute pas la vie.


1909. Encontra-se em Berna, onde segue regularmente um curso universitário.
Abril. Morte da mãe de Blaise Cendrars. O poeta apaixona-se por Bella Bender, uma estudante polaca.
Maio. Conhece Féla (polaca) com a qual se casará em 1914.


1910. Na véspera do «doctorat» abandona tudo e instala-se em Paris.


1911. Trava conhecimento com o escultor suíço August Suter, com o qual manterá uma longa correspondência. 


Féla está em Nova Iorque e Blaise em S. Petersburgo. Passa o tempo na biblioteca onde lê muitíssimo. A par de livros de poesia, pintura, música, arqueologia, encontram-se várias referências a autores místicos: S. Tomás de Aquino, Santo Agostinho, Santo Ambrósio, Santa Teresa de Ávila, S. João da Cruz. Escreve que Loyola é le patron des accouchements!
Tenta, sem êxito, arranjar emprego. Os velhos amigos parecem tê-lo esquecido.
1 de Novembro. Com um bilhetes enviado por Féla, o poeta parte para a América.
Num caderno desta época, encontra-se esta nota curiosa: Rimbaud: Littératuricide d´un rhétoricien émancipé: Racine:...Peuh! Victor Hugo...pouah! Homère...oh! la la! L´ École parnassienne... pfuit!
Começa a escrever vários livros ao mesmo tempo. O texto Hic Haec Hoc é assinado por Blaise Cendrart (com um t no final). É a primeira vez que surge o pseudónimo.


1912. Maio. Numa carta a um amigo, diz: «Só tenho um pensamento: escrever».
São deste ano Aléa, Séquences e Les Pâques à New York. Freddy Sausey transforma-se em Blaise Cendrars. Dirige-se a Genebra.
Julho. Instala-se em paris. Com dois amigos lança a revista Les hommes Nouveaux.
Setembro. É preso por ter roubado, numa livraria, L´Hérésiarque de Apollinaire.
Novembro. PublicLes Pâques à New York. Conhece Apollinaire, Sonia e Robert Delaunay, Modigliani, Chagall, etc. Entra no mundo das letras e das artes.


1913. Aparece Prose du Transsibérien, «le premier livre simultané». A obra provoca grande polémica.
Féla regressa da América e junta-se a B.C.


1914. 7 de Abril. Nasce Odilou o primeiro filho de Féla e Blaise.


28 de Agosto. Escreve a August Suter, participando-lhe que parte para a guerra. Juntamente com Riccioto Canudo redigira um apelo aos estrangeiros residentes em França para que seguissem para a frente.


1915. Uma rajada arranca-lhe a mão direita. Numa carta de 23 de Novembro enviada a Suter escreve: Você tem razão, duas pernas e uma mão bastam...


1916. Começa a escrever com a mão esquerda. Inicia o poema Rússia, santa Rússia.


9 de Abril - Nasce o segundo filho de Féla e Blaise. Chama-se Rémy, em homenagem ao poeta Rémy de Gourmont, que blaise tanto admirava.
Maio. É novamente operado. Numa carta a Suter lê-se: Tenho um belo braço mecânico.


1917. Período difícil. A perda do braço transforma-o. Recusa usar um braço articulado. A pouco e pouco afasta-se da família. Os cadernos de Freddy Sausey desaparecem. B.C. «encontra-se» como escritor. Surge Profond aujourd´hui. Conhece Raymone, com a qual virá a casa em 1944.
Sonia Delaunay publica em Portugal Futurista o poema inédito de Blaise, Tour.


1918. Fevereiro. Prepara o texto dum filme para Abel Gance. Publica Le Panama e J´ai tué. Faz planos e escreve títulos sobre obras a publicar. Os projectos cumprem-se quase inteiramente.


1919. Nascimento de Miriam, a primeira menina da família. Segundo escreve a Féla no seu Récit d´une vie, Blaise disse-lhe: A família está completa. A filha será uma ajuda para ti. Os rapazes ganharão o pão com o suor do rosto.


1921. Colabora na realização de La Roue de Abel Gance.


1922. Trabalha em Londres.


1923. Está em Roma, onde termina La Vénus Noire.
Parte para África, onde se demora cerca de seis meses. Objectivo: um documentário sobre a vida dos elefantes.


1924. Blaise descobre o Brasil, país onde voltará várias vezes e onde fará dezenas de amigos. Viaja constantemente e, segundo Louis Parrot, só vem a França para deixar os manuscritos dos seus livros.


1928. Habita num castelo. As viagens continuam. Até 1936 viajará por diversos países do continente americano.


1929. Afirma numa entrevista dada à Rèvolution Surréaliste: Só ponho no amor uma esperança: a esperança do desespero. O resto é literatura.


1934. Novas viagens. Vai a Espanha e Portugal.


1936, Visita Holywood. Conhece Al Jennings, o rei-dos-fora-da-lei, e visita, na prisão, O´Henry.


1938. Trabalha na rádio Luxemburo com Jacques-Henry Lévesque.


1939. Tem um Alfa-Romeo de desporto que ele próprio conduz com uma só mão. A carroçaria fora desenhada por Braque. Entre 3 de Setembro e 14 de julho de 1940 percorre 100 000 km.


1940. Correspondente da guerra junto do Q.G. britânico. Depois do armistício habita em Aix-en.-Provence. Escreve Ches L´ armée Anglaise, que será destruído pelos alemães.


1945. 26 de Novembro. Morte do filho Rémy, piloto de caça.


1947. Blaise tem 60 anos. No dia do seu aniversário declara que começa a acreditar na vocação de escritor.


1949. Regressa definitivamente a Paris.


1951/56. Colabora em programas radiofónicos com Nino Franck. Assinale-se a publicação de Emmène-moi au Bout du Monde! Em Ouchy tem um ataque. Mas a morte só chegará cinco anos mais tarde.


1957. O lançamento do primeiro Sputnik entusiasma o velho viajante. O editor Pierre Berès conta tê-lo encontrado felicíssimo com a proeza.


Publicação de Trop c´est Trop.


1958. Novo ataque; quase não fala e arrasta-se com dificuldade.


André Malraux, Ministe des Affaires Culturelles, põe-lhe o colar da Légion d´Honneur. A condecoração destinava-se «ao único sobrevivente dos grandes poetas do espírito moderno».


A doença agrava-se. Faz ginástica e recebe massagens para evitar a paralisia. Muda-se para um rés-do-chão da Rua José Maria Hrédia, donde sai  de dois em dois dias.
Nino Franck revela que Blaise se sentava num banco da avenida para contemplar as bandeiras do mundo inteiro hasteadas no edifício da Unesco.


1961. 20 de Janeiro. Morte de Blaise Cendrars. Construire... parece ter sido a última palavra que pronunciou.

Ingeborg Bachmann




Romancista, dramaturga e poetisa austríaca, Ingeborg Bachmann nasceu a 25 de Junho de 1926, em Klagenfurt. Testemunhou a ocupação da Áustria pelas tropas alemãs, quando contava apenas doze anos de idade, experiência que veio a manifestar na sua obra.
Estudou Filosofia e Direito nas Universidades de Innsbruck, Graz e Viena. Nesta última apaixona-se pelo poeta judeu Paul Celan, que após dois meses abandona a cidade; mantendo porém o complexo relacionamento - que influenciou a obra de ambos - à distância. Ali apresentou a sua tese de doutoramento, dedicada ao pensamento do filósofo alemão Martin Heidegger, no ano de 1950. Publicou posteriormente um ensaio sobre a Filosofia da Linguagem de Ludwig Wittgenstein.
Em 1951, estreou-se como escritora de peças de teatro radiofónico para a emissora Rot/Weiss/Rot, incumbência que abdicou em 1953, ano em que não só publicou a sua primeira colectânea de poesia,Die Gestundete Zeit (O Tempo Aprazado), que venceu o prémio do Gruppe 47, o movimento literário mais conceituado da época do pós-guerra, como também vai viver para Itália. Pouco tempo após, muda-se novamente; desta vez para a Universidade de Harvard e como professora convidada, regressando depois a Itália, onde, entre 1954 e 1955, escreveu colunas de carácter político para o jornal alemão Westdeutschen Allgemeinen Zeitung, usando o pseudónimo de 'Ruth Keller'.
Em 1958, conheceu em Paris o escritor suíço Max Frisch, com quem manteve uma relação até os inícios da década de 60, altura em que optou por uma vida mais discreta, desligando-se das suas actividades políticas e sociais, e dividindo o seu tempo entre cidades europeias como Munique, Berlim, Zurique e Roma. No ano seguinte, foi a primeira professora da recém-instituida cadeira de Poética na Universidade de Frankfurt, e em 1964 foi galardoada com o Prémio da Crítica de Berlim pela sua obra, em parte autobiográfica, Das Dreißigste Jahr (1961, O Trigésimo Ano), e com o respeitado Prémio Georg Büchner, tendo sido ainda nomeada para a Academia das Artes de Berlim Ocidental. Nesse período iniciou uma viagem pelo Sudão e Egipto. Foi-lhe entregue a Medalha Nacional Austríaca em 1968.
Na Primavera de 1973 deu uma série de conferências na Polónia, tendo visitado os campos de concentração de Auschwitz e Birkenau. A 17 de Outubro desse mesmo ano, Bachmann faleceu em Roma, três semanas após ter ficado gravemente queimada num incêndio ocorrido no seu apartamento, motivado por um cigarro mal apagado. Restam dúvidas quanto à natureza do incidente, reavivadas sobretudo pelo teor da escrita da autora, em Malina (1971, Malina): «Tenho que ter cuidado para não cair de caras no disco do fogão, para não me desfigurar, para não me queimar (...) onde tantas vezes queimei farripas de papel, não tanto para queimar qualquer coisa escrita, mas para acender um último e muito último cigarro.»
A escrita de Ingeborg Bachmann está intimamente ligada às suas experiências enquanto mulher assim como à reflexão sobre as circunstâncias históricas em que viveu e que marcaram a sua vida, do seu país e inclusivamente de todo o mundo. 

Giánnis Ritsos




















Giánnis (ou Yiánnis) Ritsos nasceu em Monemvasia, uma aldeia medieval na costa este do Peloponeso, localizada a cerca de setenta quilómetros de Esparta, no dia 1 de Maio de 1909. A sua família era constituída por latifundiários que tinham em tempo sido prósperos mas que caíram em decadência e o poeta conheceu na juventude uma pobreza quase extrema.
Desde muito jovem, Yiánnis teve de trabalhar para sobreviver. Teve uma passagem muito breve pela Faculdade de Direito da Universidade de Atenas (em 1925) e desempenhou diversos trabalhos: dactilógrafo, ajudante de notário, actor e bailarino, revisor na editora Govotsios e jornalista no jornal Avyi.
Casou-se em 1954 com a médica Falitsa Yiorgiádis, que foi, até 1970, data em que a actividade de Ritsos como escritor começou a ser sistematicamente premiada, o principal sustento económico da família. Em 1955 tiveram uma filha chamada Elefteria (Liberdade), celebrada pelo pai no livro Proino Astro (Estrela da Manhã).
Durante a vida, Ritsos lutou contra várias doenças, primeiro a tuberculose, de que sofreu pela primeira vez entre os dezassete e os vinte anos de idade e o forçou a passar quatro anos internado em diferentes sanatórios (entre 1927 e 1931) e de novo entre os vinte e oito e os trinta e dois anos de idade. Aos sessenta e um anos sofreu de cancro.
Foi nos primeiros anos em que padeceu de tuberculose que Ritsos tomou contacto com o marxismo, no Sanitório Sotirias de Atenas, e que aderiu ao partido comunista, ao qual pertenceu toda a vida.
Aos doze anos sofreu a perda do irmão, cadete da escola naval, e poucos meses depois a perda da mãe, a quem era muito unido. Outro duro golpe foi o internamento do pai num hospital psiquiátrico, quando Ritsos tinha vinte e dois anos. O pai viria a falecer e seis anos mais tarde seria a sua irmã, Lula, a quem o poeta dedica o livro A Canção de Minha Irmã, que seria internada por loucura, embora se tivesse posteriormente curado.
Nos primeiros anos da sua produção poética, a poesia de Ritsos é vista como estando muito ligada à de Kariotákis, mas mesmo nesta fase se percebe que também as dificuldades porque passou marcaram tanto (ou mais) a sua escrita quanto esta influência.
Esteve preso por razões políticas nos campos de concentração de cinco pequenas ilhas do Egeu, primeiro entre 1948 e 1953, que corresponderam aos dois últimos anos da Guerra Civil e aos três primeiros do governo supostamente democrático de Papagos.
Esteve de novo preso durante os três primeiros anos da Ditadura dos Coronéis, até que, pela sua saúde debilitada, foi internado durante seis meses num hospital de Atenas. A sua pena foi então comutada para prisão domiciliária em Samos, ilha de onde era oriunda a sua esposa, e onde costumavam passar o Verão. Paradoxalmente, este parece ter sido para Ritsos o período mais duro do tempo em que esteve confinado pela Ditadura dos Coronéis, porque nas ilhas tinha pelo menos o apoio dos companheiros.
Durante o tempo em que esteve preso, Ritsos nunca parou de escrever. É desta altura um verso seu em que diz «temos dentro de nós mil estrelas, e essas não podereis matá-las» (em «Os vizinhos do mundo», I Yitoniés tu Kosmu). Ao ser transferido de Macronisos para Ai Strati, teve de enterrar os seus manuscritos em garrafas para salvá-los.
Em 1956, Ritsos venceu o Prémio Nacional de Poesia pelo seu livro Sonata ao Luar e foi por esta altura que a sua poesia se começou a difundir fora da Grécia, particularmente em França.
Porém, é com o fim da Ditadura dos Coronéis, nos seus últimos vinte anos de vida, que o poeta começa a vencer inúmeros prémios e distinções: seis prémios internacionais de poesia; seis doutoramentos honoris causa; torna-se membro honorário de diversas academias literárias; quatro medalhas de cidades; cidadanias honoríficas; três prémios internacionais relacionados com a Paz (entre eles o Prémio Lenin e o Joliot-Curie, atribuído pelo Conselho Mundial para a Paz).
Ritsos morreu a 11 de Novembro de 1990, na sua casa de Atenas, enquanto dormia, como consequência de uma doença prolongada que já o havia forçado a ser hospitalizado durante uns meses.
Ritsos é, a par com Seféris e Élytis, um dos nomes maiores da chamada geração de 30. Os últimos dois escaparam ao «Kariotakismo», poesia tradicional, centrada na expressão de ideias auto-compassivas e auto-destrutivas, cujo nome deriva do nome do poeta Kostas Kariótakis, expoente máximo desta estética, por meio de uma renovação formal e temática, enquanto Ritsos levou mais tempo a adoptar novidades formais.
Onde Ritsos é inovador é no conteúdo. Em 1936 publica-se o seu poema «Epitáfio» em que, explorando formas tradicionais da poesia grega, Ritsos expressa numa linguagem simples e imediata uma ideia comovente de fraternidade. Este poema foi escrito em sequência da grande manifestação do 1º de Maio de Maio em Tessalónica, que foi reprimida com recurso a violência policial. Após esta manifestação, o jornal do partido comunista publicou a fotografia de uma mãe ajoelhada junto do corpo do filho, morto pela polícia. No seu poema, Ritsos empresta a voz ao lamento da mãe, recorrendo a uma forma usada em poesia grega que é o mirológio («pranto fúnebre»). Em Agosto desse mesmo ano, «Epitáfio» foi simbolicamente queimado no sopé da Acrópole, num acto que, em 1936, provocou a reacção do regime ditatorial de Metaxas. Este gesto de se colocar ao lado dos mais fracos é uma das constantes da sua poesia e da sua vida.
A maior parte dos seus poemas são de tema e extensão amplos e, à custa disto, a sua força poética é excessivamente esbatida entre elementos prosaicos. Uma excepção são os seus poemas amorosos e um conjunto de poemas mais curtos, intitulados Parêntesis e Testemunhos.
Ritsos produziu uma obra poética de extraordinária extensão: treze enormes volumes de poemas reunidos que não chegam a recolher as mais de cem colecções de poemas extensos que foram publicados como livros. O que resta da sua produção escrita é, em contrapartida, escasso: nove novelas curtas, treze traduções de poesia, alguns ensaios, quatro peças de teatro, alguns artigos de jornal. Nesta enumeração não contámos com a parte da sua obra que permanece inédita, que é, também ela, extensa.

Henri Michaux























Henri Michaux, nasceu em Namur, em 24 de maio de 1899.
Poeta francês de origem belga, oriundo de uma família burguesa com juristas, arquitectos e etc . Porém, nunca gostou do seu país, nem da sua gente ou paisagem. Desde cedo sentiu a realidade como algo distante e envergonhava-se de tudo o que o rodeava.
Então escrevia, nesse tempo já vivia no mundo como estrangeiro, pensando até em tornar-se monge. Em 1920, abandonou os estudos de medicina para realizar uma longa odisseia como marinheiro, saindo de Boulogne-sur-Mer. Nesse mesmo ano, em Roterdão, repete a experiência rumo a Buenos Aires e ao Rio de Janeiro. Aos 23 anos, descobre a literatura com o sobressalto que lhe provoca a leitura d´ Os Cantos de Maldoror (Les Chants de Maldoror, 1868), do uruguaio Lautréamont (1846-1870). A sua futura criação teria uma aura misteriosa, subterrânea, e simbolicamente obscura tal como a obra de Lautréamont.
De volta a Paris, em 1923, estuda literatura e volta a viajar até 1937 pela Ásia, África do Norte e América do Sul, revelando uma tomada de consciência em relação ao mundo e às coisas. A razão principal pela qual viaja é para expulsar do seu interior “a sua pátria, os seus vínculos de qualquer classe”. Fugindo das terras estrangeiras, enviava poemas que definiu num dos seus livros como “cápsulas de observar”. Escreveu o seu primeiro livro, Qui je Fus (1927), que o revela como escritor original; publicando seguidamente o autobiográfico Ecuador (1929), relato de uma viagem, e Une Barbare em Asie (1933), traduzido para o espanhol por Jorge-Luis Borges, que conheceu Michaux e considerou o texto “um jogo”. A seguir veio Voyage en Grande Garabagne (1936), Plume (1938) e Lointain Intérieur (1938). Visitando Montevidéu, Uruguai, em 1936, apaixonou-se pela poeta Susana Soca, que morreu jovem e era conhecida por uma legendária beleza. Anos depois, em 1943, casaria com uma mulher divorciada e tuberculosa, Marie-Louise Termet.

Michaux, odiava as artes plásticas, todavia em 1924, depois de fixar residência em Paris e ao conhecer a obra de Paul Klee, De Chirico, Max Jacob e outros surrealistas, muda de opinião. Fascinado principalmente pela criação do suíço Klee, decidiu procurar uma forma de expressão visual. Em 1937 começou a desenhar e a pintar, expondo em galerias e indo ao encontro das mesma ideias da sua literatura: uma viagem através de si mesmo. A sua técnica ágil prefere a aquarela e a tempera ao óleo, fundindo formas gráficas que lhe permitem criar um universo poético e ímpar. Não se pode definir o seu trabalho pictórico como ilustração, riscos, ideogramas ou alfabeto. Diria antes algo de inacabado e inacessível; tal como a sua literatura, outra forma mas com igual destino: o de explorar o mundo interior. Há uma espécie de tremor que habita nas suas manchas, um despojamento entre fragilidade e sobriedade. São como curtos-circuitos, caligrafia nervosa que avança e retrocede, impulsos que buscam inutilmente uma saída. “Eu queria desenhar a consciência de existir e o fluir do tempo”, confessou.

Foi colaborador assíduo da importante Sur, uma revista literária argentina que difundiu a arte inovadora, além de divulgar as actividades da Resistência francesa. Tornou-se conhecido em França a partir dos anos 40, quando André Gide escreveu um texto sobre ele. Com a trágica morte de sua esposa, falecida em consequência das graves queimaduras de um incêndio acidental em 1948, escreve em sete páginas o emocionante poema Noux Deux, Encore, depois recolhido pelo próprio autor e transformado numa obra clandestina, maldita. Cansado, levou o seu quotidiano em viagem, interrogou-se em Passages (1937-1950) : “Para quê viajar quando uma rima faz nivelar uma montanha, quando um adjectivo povoa um país, quando uma assonância faz oscilar a Terra inteira?”.

Descobriu os alucinogénios em 1956, sob controlo médico experimentou ópio, ácidos e mescalina, o principal alcalóide do peyote, produzindo através delas várias obras pictóricas e textos experimentais, vibrantes e minuciosos: L’Infini Turbulent (1957), Paix dans les Brisementes (1959), Connaissance par les Gouffres (1961) e Les Grandes Épreuves de l’Esprit (1969), Misérable Miracle (1972). Como Baudelaire, Quincey, Artaud, Cocteau, Huxley, Castañeda, Burroughs e tantos outros, buscou nas drogas a sensibilidade que habita fora dos limites da mente humana, descrevendo minuciosamente as suas sensações, pensamentos e movimentos que sentiu nas suas experiências. Carlos Castañeda, celebrizou o famoso cactos ao contar as suas experiências com Don Juan, que dizia que a mescalina ensinava a “maneira mais correcta de viver”. Artaud acreditava que com o peyote sabemos até “onde chegará o seu ser e até onde ainda não conseguiu chegar”. A droga na obra destes autores desvenda o real invisível como o verdadeiro real. Pelo peyote, os índios huichol libertavam-se dos seus pensamentos, dos seus atos (bons ou maus), desnudando-se de todo o seu eu para alcançar a liberdade pura do pensar. Ao achar concluídas as suas experiências, Michaux deixou as drogas por achar que “não estava feito para a dependência”.

A literatura híbrida de Michaux é pura entrega, êxtase, estertor interior. Tudo para dizer simplesmente que a vida está onde queremos, assim como no erro e na dúvida de cada entrega. Um jogo permanente entre a presença e a ausência, a ascensão e a queda, o circunstancial e o eu. Clássico das vanguardas, a sua obra é das mais originais do século XX. Este estranho poeta dizia que a poesia não é o verso, que está em toda a parte, e que o poema matava a poesia. Sem pertencer a qualquer escola literária, os seus inesperados textos usaram o simbolismo, o dadaísmo, o surrealismo, o existencialismo, o absurdo e fantasias irónicas e oníricas. Nem todos os lugares e povos que retratava nos seus livros são reais, muitos surgiram da sua imaginação com a precisão de um antropólogo, como os seres de Au Pays de la Magie (1941). Nele contou os costumes, os rituais e festas, o que pensam e como vivem os magos, os omobules, os ecoravetias, os nonais, os oliabares, os hivinizkis, os hacs, os emanglones e os meidosems (só para citar alguns). Com um certo humor negro, o poeta satiriza à maneira de Jonathan Swift a realidade da sociedade em que viveu. Uma veia fantástica poderosa, concentrando universos em pequenos fragmentos, imitando a realidade a partir de um mundo paralelo.
Reservado, esquivo, discreto, tranquilo e elegante, com vida social nula e poucos conhecidos, o poeta não dava entrevistas nem permitia ser fotografado, e a sua biografia, sem muitos dados concretos, só pôde ser feita através da sua correspondência privada. Nunca se considerou um literato e recusou receber o Grande Prémio Nacional de Letras, em 1965. Acreditava que a maioria das pessoas representava um papel, e que, geralmente, ele conseguia muito rapidamente arrancar essa máscara, provocando um desinteresse por elas. Franzino, de saúde frágil, naturalizou-se francês em 1955, e foi um homem sem limites geográficos, mentais ou linguísticos. Um extraordinário caso de um escritor indefinido. A sua literatura combina narração, prosa, descrição etnológica, poesia nada lírica e um certo humor surreal. Os seus textos são resultados de anotações, diários, cadernos, notas de viagem, descobrimentos, em que introduz a sua impressão pessoal, muitas vezes abstracta e simbólica. Um explorador de uma nova visão do mundo e dos seus seres. Morreu em Paris em 1984, sempre apoiado num certo desespero.



Principais obras:

Qui je Fus (1927)
Ecuador (1929)
Une Barbare en Asie (1933)
Voyage en Grande Carabagne (1936)
Plume / Lointain Intérieur (1938)
Au Pays de la Magie (1941)
Arbres des Tropiques (1942)
L’Éspace du Dedans – Pages Choisies (1944)
Épreuves, Exorcismes (1940-1944)
Ailleurs (1948)
Noux Deux, Encore (1948)
La Vie dans les Plis (1949)
Passages (1937-1950)
Mouvements (1951)
Face aux Verrous (1954)
L’Infinit Turbulent (1957)
Paix dans les Brisements (1959)
Connaissance par les Gouffres (1961)
Vents et Poussières (1962)
Les Grandes Épreuves de l’Esprit et les Innombrables Petites (1969)
Façons d’Endormi, Façons d’Éveillé (1969)
Misérable Miracle (1972)
Émergences, Résurgences (1972)
Moments,Traversées du Temps (1973)
Face à ce qui se Dérobe (1976)
Choix de Poèmes (1976)
Poteaux d’Angle (1981)
Chemins Cherchés, Chemins Perdus, Transgressions (1982)

Luiza Neto Jorge






Luiza Neto Jorge nasceu em Lisboa, a 10 de Maio de 1939.

Após a separação dos pais, fica a viver com o pai, no então chamado Bairro das Colónias, aos Anjos, onde frequenta a escola primária. Há referências a este período no poema autobiográfico “Anos quarenta, os meus”: a proximidade do Castelo de São Jorge (“De eléctrico andava a correr meio mundo/subia a colina ao castelo-fantasma”), os problemas respiratórios (“[...] E sofria de asma//alma e ar reféns dentro do pulmão”), a instrução primária salazarista (“Salazar três vezes, no eco da aula”), os jogos de infância no Jardim dos Anjos (“E o meu coito quando jogava a apanhar/era nesse tronco do jardim dos anjos”), o fim da guerra (“acabou a guerra meu pai grita ‘Viva’”), os passeios até ao Terreiro do Paço (“Deflagram no rio golfinhos brinquedos//Já bate no cais das colunas uma/onda ultramarina onde singra um barco/pra cacilhas [...]”), as idas ao Cinema Lis, na Avenida Almirante Reis (“No cinema lis luz o projector/e o FIM através do tempo retine”).

A seguir ao falecimento do pai, passa a viver com a mãe e o irmão, na Rua da Misericórdia, nº 17 – 4º Esq., que seria a sua residência até ao fim da vida (a Rua do Mundo, que menciona no título de um poema de A Lume, utilizando a designação que a artéria anteriormente tivera, na primeira república, em referência a um jornal com esse nome).
Depois de um período de doença, que levaria a internamento hospitalar, frequenta o Externato Feminino Francês, situado na Rua do Salitre, onde completa os estudos liceais, indo fazer o exame do sétimo ano ao Liceu D. João de Castro; os primeiros anos, fizera-os no Liceu Dona Filipa de Lencastre, no Arco do Cego.

Em Outubro de 1957, ingressa no curso de Filologia Românica da Faculdade de Letras de Lisboa, que seguiria até 1961, quando o interrompe para ir leccionar no Liceu de Faro, no ano lectivo de 1961-1962. Nessa cidade vive com António Barahona, com quem, entretanto, casara, e fortalece laços de amizade e convívio assíduo com António Ramos Rosa, Casimiro de Brito e José Afonso, este último professor na Escola Comercial e Industrial de Faro.

Em 1960 sai na colecção A Palavra, de Faro, o seu primeiro conjunto de poemas, a plaquette A Noite Vertebrada, e, no ano seguinte, participa em Poesia 61, com Quarta Dimensão. Por altura da saída desta publicação, declara ao Diário de Lisboa (25 de Maio de 1961): “A moderna poesia ocidental tem raízes bastante fundas no surrealismo. [...] Parece-me que, entre nós, o surrealismo ainda terá a sua razão de ser – como total destruição de cânones bafientos, como reacção a um ambiente social rígido. Depois será talvez mais fácil, mais possível, a total reconstrução, formas e ideias novas.”

A partir dos finais de 1962, na sequência do seu divórcio de António Barahona, passa a viver quase permanentemente em Paris, onde exerce diversas profissões, entre as quais a de empregada de livraria. Publica, em 1964, 1966 e 1969, respectivamente, os livros Terra Imóvel, O Seu a Seu Tempo e Dezanove Recantos. A propósito deste último livro, fala de “uma revolta das palavras (...) apelando para um novo discurso” (A Capital, 16 de Abril de 1969). Regressa definitivamente de Paris em 1970, passando a dedicar-se com regularidade ao trabalho de tradução, quer para casas editoras, quer para companhias teatrais. Escreve os diálogos de vários filmes portugueses, ou neles colabora. Quer como tradutora, quer como autora de textos para cinema, quer ainda como adaptadora para teatro (O Fatalista de Diderot, espectáculo criado por Osório Mateus, em 1978), granjeia um enorme prestígio, pela reconhecida qualidade excepcional do seu trabalho.

Casa com Manuel João Gomes, de quem terá o seu filho único, Dinis, nascido em 1973.

Em 1973, publica uma recolha de toda a sua poesia, intitulada Os Sítios Sitiados, na qual inclui algumas secções inéditas e o poema, que tivera já uma edição autónoma, ilustrada pelo pintor Jorge Martins, O Ciclópico Acto (1972).

No início da década de 80 é produzido para a RTP (série Artes e Letras) e realizado por João Roque um filme de cerca de quinze minutos, em que Luiza Neto Jorge é entrevistada e lê o poema “Fractura”, escrito em 1980 e dedicado ao pintor José Escada, recentemente falecido.

A partir de 1984, surgem alguns poemas em revistas, nomeadamente na Colóquio/Letras, nºs. 78 (Março de 1984) e 97 (Maio-Junho de 1987), e Pravda nº 6 (1988), onde aparece, pela primeira vez, com incorrecções no 1º verso da 2ª estrofe, o poema “Minibiografia”.
Depois de mais de dez anos sem publicar nenhum livro, edita, em 1984, em circuito privado, um livro artesanal, constituído por manuscritos policopiados e intitulado 11 Poemas, com onze desenhos de Jorge Martins, de que foram tirados 100 exemplares.

A sua doença respiratória crónica agrava-se seriamente, fazendo-a depender do consumo de oxigénio durante um número cada vez maior de horas e obrigando a vários internamentos no Hospital Pulido Valente. Vem a morrer, a 23 de Fevereiro de 1989, no Hospital Curry Cabral, para onde fora transferida.

Em Maio do mesmo ano, é publicado o livro póstumo A Lume, que deixara ordenado, mas iria exigir uma difícil fixação do texto, devido às inúmeras emendas e rasuras existentes no original, trabalho realizado por Manuel João Gomes.

Em 1993 sai, em edição organizada por Fernando Cabral Martins, o volume Poesia, onde se encontra reunida toda a sua obra poética (Assírio & Alvim).


Biografia elaborada por Gastão Cruz

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Obra publicada:

A Noite Vertebrada, Colecção “A Palavra”, Faro, 1960
Quarta Dimensão, Poesia 61, Faro, 1961
Terra Imóvel, Portugália Editora, Lisboa, 1964
O Seu a Seu Tempo, Ulisseia, Lisboa, 1966
Dezanove Recantos, Iniciativas Editoriais, Lisboa, 1969
O Ciclópico Acto (poema para livro-objecto de Jorge Martins), Livraria-Galeria 111, Lisboa, 1972
Os Sítios Sitiados, Plátano Editora, Lisboa, 1973 (inclui todos os livros anteriores, revistos, e partes inéditas)
11 Poemas (Silves, 1983), edição privada em fotocópias, Lisboa, 1984
A Lume, Assírio & Alvim, Lisboa, 1989
Poesia, Assírio & Alvim, Lisboa, 1993


Como tradutora deixou uma obra inigualável, nos domínios da poesia, da ficção e do teatro, abrangendo autores como Céline - Morte a Crédito valeu-lhe o prémio de tradução do PEN Clube -, Sade, Goethe (o Fausto), Verlaine, Marguerite Yourcenar, Jean Genet, Witold Gombrowicz, Apollinaire, Karl Valentim, Garcia Lorca, Ionesco, Boris Vian, Oscar Panizza, entre outros.

Fez adaptações de textos para teatro (Diderot, etc.) e colaborou com alguns cineastas, tendo escrito diálogos para filmes de Paulo Rocha e Solveig Nordlund, o argumentos de Os Brandos Costumes, de Alberto Seixas Santos (1975) e assistência literária em Relação Fiel e Verdadeira, de Margarida Gil (1989).

Daniel Faria







Daniel Augusto da Cunha Faria,
nasceu em Baltar a 10 de Abril de 1971.







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No Jardim-de-infância Glória Leão iniciou a sua vida escolar. Frequentou o ensino primário na Escola de Feira nº 2 (Calvário) (1977/81) e o ciclo preparatório na escola, ao tempo, Preparatória de Baltar (agora EB 2/3) (1981/83)

Após os primeiros encontros no pré-seminário (1982-83), entrou para o Seminários do Bom Pastor (1983-86), de Vilar (1986-89) e Maior (1989-94), tendo entre 1983-86, como os colegas do mesmo ano do seminário, frequentado a Escola Secundária Rodrigues de Freitas.


Entrou logo depois para o Curso de Teologia na Universidade Católica. Entre 1994 e 1998 licenciou-se em Estudos Portugueses na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, apresentando em 1996, ao mesmo tempo que frequentava Letras, a Tese de Licenciatura em Teologia, intitulada A Meditação da Paixão na poesia de Frei Agostinho da Cruz, mais tarde editada com o título: A vida e conversão de Frei Agostinho, entre a aprendizagem e o ensino da Cruz.

Decidiu então optar pela vida monástica, sendo Postulante, no ano de 1997-98, no Mosteiro Beneditino de S. Bento da Vitória, e noviço, no ano seguinte, no Mosteiro de Singeverga.

Muito cedo se revelou invulgarmente inteligente e sossegado. Nunca desdisse essa imagem precoce de menino com os olhos muito claros, a partir das primeiras letras passou a dedicar todo seu tempo à leitura, sobretudo, à escrita.

A família relembra-o quase sempre a escrever.

Desde a primeira catequese manifestou o desejo de ser sacerdote.

A par da sua vida académica desenvolveu todo um trabalho de serviço à comunidade, nomeadamente nas Paróquias do Marquês, no Porto e na do Marco de Canaveses.

Cultivou a amizade com a doação pródiga de quem não conhece limites. Com o tempo desdobrado em muitos afazeres, nunca mostrou ter pressa.



Fez desenhos, colagens, mobiles, encadernação e encenação. Dirigiu no Seminário Maior o Círculo de Leitura (s) (1989/93); ganhou vários prémios literários e escolares, colaborou em diferentes revistas.

- Prémio Eng.ª Nuno Meireles (1990 – Uma cidade com muralha)
- Prémio Sebastião Salgado – (1991)
- Prémio D. António Ferreira Gomes (1992)
- Prémio Fundação Manuel Leão (1998 - Explicação da Árvores e de Outros Animais)
- Prémio Teixeira de Pascoaes – (2004 – Poesia)

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A sua obra literária e já publicada em alguns casos com reedições:

1991 - Uma cidade com Muralha
1992 – Oxálida
1993 – A Casa dos Ceifeiros
1998 – Explicação da Árvores e de Outros Animais (Prémio Fundação Manuel Leão)
1988 – Homens que são como Lugares mal Situados
1999 – A vida e conversão de Frei Agostinho; entre a aprendizagem e o ensino da Cruz
2000 – Dos Líquidos
2000 – Legenda para uma casa habitada

Em 2003 a Quasi Edições editou num só volume todos os livros de Poesia: “Poesia – Daniel Faria”

Muitos dos seus poemas integram antologias de poesia, nomeadamente:

- A Poesia está na rua – 25º Aniversário do 25 de Abril. Organização de Francisco Duarte Mangas. INATEL/Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto – 1999)
- Encontros de Talábriga – 1º Encontro Internacional de Poesia de Aveiro. Coordenação de Egipto Gonçalves e Rosa Alice Branco, Aveiro. Fundação João Jacinto de Magalhães, 1999.
- O Futuro em Anos-Luz – 100 anos, 100 poetas, 100 poemas. Selecção e organização de valter hugo mãe. Porto 2001.Quasi Edições 2001.
- Anos 90 e Agora – Uma antologia da nova poesia portuguesa. Selecção e organização de Jorge Reis – Sá. Famalicão. Quasi Edições 2001.
- Século de Ouro – Antologia Crítica da Poesia Portuguesa do Século XX. Organização de Fernando Silvestre e Pedro Serra. Braga/Coimbra/Lisboa. Angelus Novos e Cotovia. 2002.
- Há no mundo inteiro, uma quando muito, rua difícil de encontrar – Metáfora Viagem: palavras de poeta. Organização de Ana Castro e Jorge Roque, Lisboa. IPBL. Dia Mundial da Poesia, 2003.
- A Alma não é Pequena – 100 poemas portugueses para SMS. Selecção e organização de valter hugo mãe. Famalicão. Centro Atlântico 2003.

No quadro do lançamento da Anthologie de la jeune poésie portugaise, editada pela Maison de la Poésie Rhône-Alpes, o Centro de Língua Portuguesa do Instituto Camões na Universidade Lumiére Lyon 2 realizou no dia 23 de Abril de 2004 um encontro com os poetas Isabel Cristina Pires e Fernando Pinto do Amaral. Além de Daniel Faria, Francisco José Viegas, José Luís Peixoto e Pedro Mexia, são alguns dos nomes que constam desta antologia e cujos poemas foram traduzidos para Francês.


Para além de ter colaborado em diversas revistas, tais como:

- Limiar – Revista de Poesia, Porto, nº 11. 1999
- Hablar/Falar de Poesia – Badajoz/Lisboa, nº. 4, 2000.
- Cadernos – Centro Catecumenal Igreja do Porto, Porto. Ano I, nº 1, 2000
- Folhas Caídas – Porto, Biblioteca Municipal Almeida Garret, Setembro 2003, Semanas 1-4.
- Apeadeiro – Revista de Atitudes Literárias. Famalicão, n.ºs 4 / 5, 2004.
- PRIMEIRA@PROVA – Revista electrónica de Línguas e Literaturas da Faculdade de Letras do Porto.
- Sara Fazib – Revista electrónica


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Considerado por alguns como um Poeta Maior da Língua Portuguesa e o maior poeta místico português do século XX para outros, que o colocam na linha de S. João da Cruz e de Santa Teresa do Menino Jesus onde foi buscar referências bem como em alguns Poetas Portugueses como Herberto Hélder; Sophia, Pessoa e Eugénio de Andrade entre muitos outros, mas é sobretudo da Bíblia que lhe vem a maior parte dessas referências.

A sua Tese de Licenciatura em Teologia – A vida e conversão de Frei Agostinho; entre a aprendizagem e o ensino da Cruz – Editada pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica, está esgotada.

A Câmara Municipal de Penafiel, em Maio de 2004, instituiu um prémio de Poesia com o seu nome destinado a jovens poetas até aos 35 anos.

A 9 de Junho de 1999, na sequência de uma queda doméstica, deixou de respirar.

António José Forte




Ligado ao movimento surrealista em Portugal, António José Forte (1931-1988) deixou-nos uma obra breve, mas que claramente o afirma como um dos poetas mais em destaque, não só pela coerência literária que assumiu e antes pelo rigor e expressividade do próprio “discurso” poético, como se patenteia em Uma Faca nos Dentes, livro reeditado, com desenhos e fotografias da pintora Aldina Costa, sua companheira de muitos anos.


Trata-se realmente de um livro quase esquecido após a sua edição em 1983 e se afirma como um marco pessoal no pleno entendimento do que foi o surrealismo poético em Portugal. Na sua “nota inútil” à laia de prefácio, Herberto Helder declara que “a voz de António José Forte não é plural, nem directa ou sinuosamente derivada, nem devedora. Como toda a poesia verdadeira, possui apenas a sua tradição. A tradição romântica. No mesmo estrito e mais expansivo e qualificado registo. Uma tradição próximo de nós esclarecida pelo surrealismo, abrindo para trás e para diante: imemorial, dinâmica. Uma maneira de entender-se uma tradição essencial”.
Ora, o sentido da palavra em António José Forte é o da subversão das ideias, das imagens de arrepio, da tensa e lúcida atenção que é dada a um quotidiano suportado em amargura, de faca nos dentes (e nunca na liga), nesse “discurso” aparente de tirar partido da linguagem dos gestos, ideias e sentimentos: “ainda não há camas só para pesadelos / ainda não se ama só no chão / ainda não há uma granada / ainda não há um coração“.
Mas nada escapa no limite estrito do verso ou da imagem, nada se mostra excessivo ou desnecessário, porque as palavras revelam o sentido de uma consciência de peito aberto à vida: “Sai de novo para o mundo. / Fechada à chave a humanidade janta. / Livre, vagabundo / dói-lhe um sorriso nos lábios, canta“. E é nas possíveis leituras cruzadas ou no eco de outras vozes que nos chegam, na atenção prestada ao mundo em redor e na carga emotiva do que dele se invoca. “Dente por dente: a boca no coração do sangue: / escolher a tempo a nossa morte é amá-la”.
É por aí que os textos e poemas de Uma Faca nos Dentes se nos revelam, ainda com redobrada surpresa e alegria, como punhal arremetido contra o cerco que tanto bloqueia, no desejo libertador de atenuar o peso do quotidiano e reabilitá-lo na justa dimensão do que lhe confere outro sentido. Talvez ainda (e sempre de forma coerente) entre a perversão do próprio discurso e a utopia ideológica, pela afirmação desse tom muito próximo de um revivificante surrealismo poético, como acentua Herberto Helder. Mas um pouco como Breton, poderá dizer-se que escrever para António José Forte é “aquilo que sabe fazer melhor” - e por isso escreveu pouco, talvez apenas o necessário para deixar vincada a sua presença e ter a certeza de haver “gente que nunca escreveu uma linha que fez mais pela palavra que toda uma geração de escritores”. Porque a expressão de António José Forte, no que revela de paradigmática na clara filiação surrealista que não enjeitou, se afirma não só no conjunto de poemas, mas nos textos de intervenção que evocam outras presenças para justificar esse fascínio e a carga de uma perversão sadia, próxima da ironia mordaz e acintosa, sempre inteligente, endereçada aos “profissionais da nossa esperteza literária”, que se observa em muitas páginas deste livro. E da “presença” de António Maria Lisboa à “ausência” de Jarry perpassa nas páginas de Uma Faca nos Dentes toda uma imaginística e uma visão do quotidiano que se valoriza e redescobre nas entranhas e intenções de rebeldia, devastação e insubordinação desse mesmo quotidiano: “Não estranheis os sinais, não estranheis este povo que oculta a cabeça nas entranhas dos mortos. Fazei todo o mal que puderdes e passai depressa”.
Por isso, este livro agora reeditado surge como a voz renovada de um surrealismo que nada perdeu do sentido superiormente poético da vida nem deixou envelhecer o seu carisma de directa intervenção cultural. E só por isso se deve assinalar a reedição de Uma Faca nos Dentes, em que António José Forte retoma o “discurso” nunca interrompido pelo tributo devido ao surrealismo, mesmo que o seja só à escala e dentro dos nossos limites.Mas a essa escala e nesses limites, pela atenção e a natural agressividade do mundo que nos rodeia, num canto e voz tão peculiares, os poemas e textos deste livro confirmam assim que o poeta de 40 Noites de Insónia continua ainda como referência passados alguns anos sobre a sua morte física.


Obra publicada:

Noites de Insónia de Fogo de Dentes numa Girândola Implacável e Outros Poemas (1958)
Uma Rosa na Tromba do Elefante (1971) – Livro para crianças
Uma Faca nos Dentes (1983) – Prefácio de Herberto Helder e desenhos de Aldina
Azuliante (1984)
Caligrafia Ardente (1987)
Corpo de Ninguém (1989)
Uma Faca nos Dentes (2003) – Reedição com inéditos
Mano Forte – Correspondência entre Luiz Pacheco e A. J. Forte.

Luís Miguel Nava




Luís Miguel de Oliveira Perry Nava (Viseu, 29 de Setembro de 1957 — Bruxelas, 10 de Maio de 1995) foi um escritor português.

Foi considerado uma das revelações mais importantes na poesia portuguesa da década de 1980.



O seu primeiro livro foi publicado em 1974 e intitulava-se Perdão da Puberdade, que o autor nunca incluiu na sua bibliografia activa.

Em 1975, conheceu Eugénio de Andrade e decidiu destruir tudo o que tinha escrito até então, está assim explicado qual o motivo da atitude anterior.

Em 1978, recebeu o Prémio Revelação da Associação Portuguesa de Escritores com a obra Películas, editada em 1979.

Em 1980, terminou a licenciatura em Filologia Românica na Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa. Entre 1981 e 1983 foi assistente nessa mesma Faculdade.

Em 1983, partiu para a cidade de Oxford como leitor de português e, passados três anos concorreu a um lugar de tradutor da então Comunidade Económica Europeia. Ganha o concurso e instala-se em Bruxelas em 1986, onde morrerá assassinado em 1995.


Obra poética

* Películas. Lisboa: Livraria Moraes Editores (1979) (Prémio de Revelação da Associação Portuguesa de Escritores, 1978)
* Inércia da Deserção. Lisboa: &Etc. (1981)
* Como Alguém Disse. Lisboa: Contexto (1982)
* Rebentação. Lisboa: &Etc. (1984)
* Poemas. Porto: Limiar (1987) (reedição conjunta dos livros anteriores)
* O Céu sob as Entranhas. Porto: Limiar (1989)
* Vulcão. Lisboa: Quetzal (1994)
* Poesia Completa 1979-1994. Lisboa: Publicações Dom Quixote (2002), com organização e posfácio de Gastão Cruz e prefácio de Fernando Pinto do Amaral