Mostrar mensagens com a etiqueta adrienne rich. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta adrienne rich. Mostrar todas as mensagens

O sonho de uma língua comum

VIII

Consigo ver-me há anos em Sunion,
doendo-me de um pé infectado, Filoctetes,
em forma de mulher, coxeando o longo caminho,
deitada num promontório sobre o mar escuro,
olhando pelas rochas vermelhas até onde uma espiral silenciosa
de brancura me dizia que uma onda tinha rebentado,
imaginando a força daquela água lá das alturas,
sabendo que suicídio deliberado não era comigo,
mas o tempo todo cuidando, medindo aquela ferida.
Pois bem, tudo isso acabou. A mulher que prezava
o seu sofrimento está morta. Sou a sua descendente.
Amo o tecido cicatrizado que me legou,
mas quero partir daqui contigo
combatendo a tentação de fazer da dor uma carreira.


Adrienne Rich
Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia, 2008
Tradução de Maria Ramalho e Monica Andrade


O Deserto como Jardim do Paraíso

8.

Que significaria pensar
que se é parte de uma geração
que tem simplesmente de passar?
Que significaria viver
no deserto, procurar viver
uma vida humana, algo
a transmitir aos filhos
para levar até à terra?
Que significaria pensar
que se nasceu acorrentado e que só o tempo,
nada do que se possa fazer
poder remir a escravidão
em que nasceu?



Adrienne Rich
Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia, 2008
Tradução de Maria Ramalho e Monica Andrade

Tempo Norte-Americano II

Tudo o que escrevemos
Será usado contra nós
ou contra aqueles que amamos.
São estas as condições,
é pegar ou largar.
A poesia nunca teve hipótese
de se pôr fora da história.
Um verso dactilografado há vinte anos
pode ser escarrapachado a tinta na parede
para glorificar a arte como distanciamento
ou tortura daqueles que
não amamos mas também
não quisemos matar

Nós seguimos mas as nossas palavras ficam
tornam-se responsáveis
por mais do que tínhamos na intenção

e isto é privilégio verbal



Adrienne Rich
Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia, 2008
Tradução de Maria Ramalho e Monica Andrade

Rhyme

Walking by the fence but the house
not there

going to the river but the
river looking spare

bones of the river spread out
everywhere

O tell me this is home

Crossing the bridge but
some planks not there

looking at the shore but only
getting back the glare

dare you trust the river when there’s
no water there

O tell me is this home

Getting into town seeing
nobody I know

folks standing around
nowhere to go

staring into the air like
they saw a show

O tell me was this my home

Come to the railroad no train
on the tracks

switchman in his shanty
with a great big axe

so what happened here so what
are the facts

So tell me where is my home



Adrienne Rich
Telephone Ringing in the Labyrinth: Poems 2004 – 2006
NY: W.W. Norton & Company, 2007