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morreu-se-me de mim

morreu-se-me de mim
bastante, mas não demasiado
que o pouco que ficasse
não desse a mão ao
muito que se foi e
recompusesse algo de
parecido comigo que
de novo a vida
se preparasse para morrer

Bénédicte Houart
Vida: variações
Livros Cotovia, 2008

Vezes por ano celebramos

vezes por ano celebramos o aniversário dos mortos
miramos os seus retratos, mas vemo-nos a nós
num espelho tão cruel quanto carinhoso
mais velhos um ano, eles, e nós
mais próximos do nosso último retrato
oh sim, fazemos anos nos mesmos dias

happy birthday, parabéns
pode-se continuar morrendo pela eternidade



Bénédicte Houart

Vida: variações
Livros Cotovia, 2008

Chamam as coisas pelos nomes

chamam as coisas pelos nomes
são as crianças
se os desconhecem
observam-nas devagar e
sem pestanejar

depois pegam no dicionário
abrem-no ao acaso
aqui está! é esta
a palavra certa
os pais corrigem
trocaste-as
como de costume
tolice, replicam
empinando o nariz
se foi ela que me disse
que se chamava assim



Bénédicte Houart
Vida: variações
Livros Cotovia, 2008

a puta da língua

a puta da língua
vai com todos
a mim sempre se recusa alegando
sonolência dor de costas sangue a mais medo de parir
faço-lhe um filho faço-lhe dois faço-lhe muitos
quem sujo de sangue aparece sou eu
quem lava e esfrega é ela ah
grande amor grande dor
de corno



Bénédicte Houart
Vida: variações
Livros Cotovia, 2008

onde estiveram eles

onde estiveram eles
por que caminham como se de tão longe
que nenhum passo pesado que baste
como se um em frente para outro inverso
como se andar sequer fosse indiferente
que nenhuma palavra suficientemente dorida
que só o silêncio e que nem ele
que nada porventura ou só a vida



Bénédicte Houart
Vida: variações
Livros Cotovia, 2008