«Deixarei de responder às perguntas. Tentarei também não as fazer. Há-de ser possível enterrar-me, deixarei de ser visto à superfície. Daqui até lá fico a contar histórias de mim para mim, se for capaz. Não serão histórias do mesmo género que antes, mais nada. Serão histórias nem bonitas nem feias, calmas, nelas já não haverá fealdade, nem beleza, nem febre, será quase vida, como o artista. O que é que eu disse agora? Não tem importância. Prometo-me muita satisfação, uma certa satisfação. Estou satisfeito, aí está, estou pronto, reembolsam-me, já não preciso de nada. Deixem-me começar por dizer que não perdoo a ninguém. Desejo a todos uma vida atroz e depois as chamas e o gelo dos infernos e nas execráveis gerações vindouras uma memória honrada. Por esta noite basta.»
(...)

Samuel Beckett
Malone está a morrer
Dom Quixote, 1993
Tradução de Miguel Serras Pereira

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