Início de Agosto

Início de Agosto. Há um ano atrás, eu estava na Rússia. O calor era intenso, as ruas de Moscovo ardiam, o céu estava sempre coberto por nuvens brancas, e por cima do campo de aviação os pilotos cruzavam-se, vacilavam e tornavam a juntar-se, como veleiros, momentos antes da tempestade. A juventude entusiasmava-se com os saltos de pára-quedas. De uma altura de cinco ou seis mil metros, os pára-quedistas lançavam-se na vertigem do vazio, deixavam-se cair como pedras e ao mesmo tempo cantavam, para não serem mortos pela pressão atmosférica. Aos nossos ouvidos chegavam fiapos do seu canto heróico. Depois, já muito perto do solo, já muito perto do cume prateado das torres de rádio, abriam o pára-quedas e aproximavam-se do solo devagar. Quanto tempo duraria? Minutos? Víamos como eles caíam, numa lentidão terrível, e como depois flutuavam. Tudo numa fracção de segundo. Uma proletária de dezassete anos lançou-se de uma altura de três mil metros e matou-se. Quando a encontraram, a mão agarrava com toda a força a asa da sacola, em vez do fio que abriria o pára-quedas. Terá sido proclamada «heroína do povo»?



Annemarie Schwarzenbach
Morte na Pérsia
Tinta-da-China, 2008
Tradução de Isabel Castro Silva

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