«Desataram a esfrangalhar as plantas pelo simples prazer de destruir. Foi uma devastação, em todos os sentidos da palavra. O jardim, que desde há muito perdera todo o interesse para mim, ficou de súbito transformado num mundo diferente. O andor foi passeado por todos os recantos do terreno e os arbustos, arrancados com fúria, foram espezinhados. Quando não conseguia compreender o que se passava. Os ruídos neutralizavam-se mutuamente e eu tinha a sensação absoluta de que os meus ouvidos eram alternadamente feridos por ondas de silêncio gelado e por um roncar surdo desprovido de sentido. O mesmo acontecido com as cores - o dourado e o vermelhão, o violeta e o verde, o amarelo e o azul-acinzentado -, todas palpitando e fervilhando, como que fundindo-se numa única cor, em que agora o ouro, depois o vermelho, assumiam a dominância.
No meio de tudo isto, uma única coisa se me impunha com alucinante nitidez, algo que simultaneamente me causava horror e me dilacerava, enchendo-me o coração de uma inexplicável angústia. Era a expressão dos rostos dos jovens que transportavam o andor - a expressão da mais obscena e manifesta embriaguez que imaginar se possa...»
Yukio Mishima
Confissões de uma máscara
Assírio & Alvim, 1995
Tradução de António Mega Ferreira
Sem comentários:
Enviar um comentário