Um Fantasma: II. O Perfume

Já respiraste alguma vez, leitor,
Com gula, embriaguez, lento desejo,
Os ares de incenso que enchem uma igreja
Ou o esquecido almíscar de uma bolsa?

Profundo encanto, a ir-nos exaltando
Quando o presente restaura o passado!
Assim num adorado corpo o amante
Colhe a flor mais selecta da saudade.

Dos cabelos espessos, tão elásticos,
Turíbulo de alcova ou de bordel,
Subia um cheiro indómito e selvagem,

E dessas musselinas ou veludos,
Impregnados de pura juventude,
Ia alastrando um perfume de peles.



Charles Baudelaire

As Flores do Mal
Assírio e Alvim, 1992
Tradução de Fernando Pinto do Amaral

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