Nocturno

os teus anos festejam-se
à hora maldita de meia noite
quando os burgueses se vão deitar
mesmo que não tenham sono
e nós nos despedimos
de mais um domingo de rastos
vamos para outro dia qualquer
fazer barulho
vamos para o meio da noite
pôr em causa a chatice de vida
não deixar que ninguém durma
vamos arrombar com euforia
dentro dos bolsos rotos
os bares que ainda estão abertos
e dar-te beijos a cair de bêbados
porque fazes anos à mesma hora
a que se passam crimes e roubos!

os teus anos festejam-se
no meio da rua toda a cidade
à hora maldita de meia noite
como os palhaços e as revoluções
e vamos pôr na rua
o público dos teatros
com tomates e nomes feios
só porque hoje e só por isso
o teu corpo faz anos!

Joaquim Castro Caldas
Português suave
Edição de autor, 1978

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