aqui estou eu entre demónios e paredes lisas
solicitando certificados bulas para viver melhor à sexta-feira
vale-me não ser ninguém: faziam-me a vida negra
assim basta o cinzento fato completo silencioso com lugar para os olhos
levantar cedo ver passar os carros
estou certo que o que digo já foi dito e selado
agora não me resta poesia alguns dias mais oscilando a cabeça
fazendo que sim
dá vontade de fugir vomitando tudo em volta mas o preço é preciso
se ao menos inventasse a cura do ar podia secar tranquilamente
agora espero pelo meio do escuro para gritar errei! errei! desmanchando o
[cabelo
nada disto é a minha vida!
para que ninguém ouça nas coloridas salas do inferno terceira repartição
onde somos, mas todos, contínuos de comer fora
Melhor seria ter ficado de lado entregue à simplicidade dos caminhos
sabendo que em nenhum lugar está a minha parte
Ao atravessar as ruas há outros como eu
a jeito para enfiar uma navalha ao fim da tarde
Aqueles para quem o mundo ia ser outro de mãos lavadas
e ficou tudo igual com mais ausentes à mistura
Um dia destes dou baixa dos infernos por motivos de cegueira interna
ou mando-me de um sítio alto
depois não sei se voltarei feito demónio de província
ou ficarei eterno como um exemplo a não seguir
António Franco Alexandre
Poemas
Assírio & Alvim, 1996
Sem comentários:
Enviar um comentário