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falo contra as palavras que se esvaem, paro no meio de uma fra-
se e olho em volta, como se quisesse encontrar a palavra que me
falta, como se as palavras fossem objectos. E fica a minha voz
parada. Levanto a mão, a direita, frente aos olhos de quem me
escuta, abertos, tão grandes que desaparece neles a intenção. E
procuro, aflita. As pessoas perguntam-me: que tens?, e eu, cala-
da, a sentir uma bola na garganta, feita das palavras todas de que
não me lembro, tens bócio: diz-me o meu irmão: tens bócio co-
mo a nossa mãe, de repente lembro-me de que nunca mais me
lembrei de minha mãe, e quero responder-lhe: não é bócio, são
frases esquecidas, são letras que não se juntam, às vezes, os
olhos dos outros param na minha boca, inquirem o meu silêncio
e esperam que eu fale, e o silêncio aumenta, até todo o meu cor-
po ser a falta de uma palavra, começo então a suar, as mãos fi-
cam viscosas, os lábios secos, e eles continuam a olhar-me:
fala.
(voz cega, sobre a mulher que esconde o nome inarticulado do
filho)
- que não tive, que não poderei ter

(...)

Rui Nunes
A boca na cinza
Relógio D´Água, 2003

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