Horror

2.

A criança, quando chora, não compreende que
nas suas lágrimas o que se derrama é o espaço
frio em que a esperança de vida já não flutua.
Assim, se se aproxima da mesa mantém-se
calada, atenta ao sentimento do horror que
do fundo da experiência em si se desprende.
E pergunta-se: o que é o sofrimento? Não
sabe, e no entanto com que restos de imagens
compõe o quadro? Que sobraria da paisagem
se ouvido o lamento nenhum fantasma viesse
para nos receber, cruzando com as asas
um capo de nenúfares? A imensidade
da alma então gela-se por dentro: deixando
que a água invada os claustros, para que
arrefeçam de medo os reflexos das nuvens.

Fernando Guerreiro
Grotesco
Black Sun Editores, 2000

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