Bina vivia num barracão
na estrada torta e levava em passeio
um cabra pelos carreiros.
Ninguém sabia se era homem ou mulher:
tetas tinha, mas também bigodes
e tamancos de montanha.
Nós, crianças, procurávamos descobrir
se por baixo do saiote se via alguma coisa,
mas ela apertava as pernas
envoltas nas ceroulas.
Com homens nunca se soube se foi,
com um animal talvez, mas conta-se
que à mais velha das três irmãs americanas
fazia tirar o leite das tetas da cabra.
Dizia-lhe em voz baixa: «Aperta-a na mão, mantém-na dura,
não a deixes». E por vezes com a sua mão cobria
a mão da moça e os últimos puxões
fazia-os com ela para mostrar que sempre restava
no fundo da teta uma gota de leite.
Agora Bina tem quase cem anos. Caminha
atrás da cabra e não olha para a cara de ninguém.
Tonino Guerra
O mel
Assírio & Alvim, 2003
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