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Um dia abres os olhos e descobres
os inexactos corpos misturados
e ficas sem saber de que maneira
este estranho centauro nomear.
já te espantou o lume, quando viste
uma língua no sonho da saliva,
e te riste, de ser tão branco o sangue
que nas beiras da noite adormecia.
Agora é o teu corpo que procura
na orla da floresta, uma fogueira
onde acordar as mãos de forma humana
e resolver enfim, mas para sempre,
se ser o sacro emblema do horror
ou o primeiro verso de um poema



António Franco Alexandre
Duende
Assírio & Alvim, 2002

2 comentários:

Nuno Dempster disse...

À medida que releio António Franco Alexandre uma, outra e outra vez, vou consolidando em mim a grande qualidade deste poeta, pouco badalado, eu sei, mas por escolha dele, e a meu ver o mais consistente entre os portugueses vivos, sem nenhuma excepção, nem sequer por esquecimento.

L.N. disse...

obrigado nuno pelo comentário. concordo em parte com a sua opinião, porém creio que é um pouco discutível; o caso mais flagrante será herberto helder que, como é sabido por todos, vive praticamente recluso, todavia bastante badalado e, suponho que não por opção do próprio, e é sem a menor dúvida um dos mais consistentes em toda a sua obra: o poema contínuo.