“O desconhecido ia ao volante, o amante sentado ao lado da jovem, e era o amigo, o desconhecido, quem falava para explicar à jovem que o seu amante estava encarregado de prepará-la, que ia atar-lhe as mãos atrás das costas, acima das luvas, desfazer-lhe e enrolar-lhe as meias, tirar-lhe a cinta, as calças e o soutien, vendar-lhe os olhos. Que em seguida ela seria conduzida ao castelo onde seria instruída de tudo o que deveria fazer. Com efeito, uma vez assim despida e amarrada, ao fim de meia hora de viagem ajudavam-na a sair do carro, obrigavam-na a subir alguns degraus, depois transpor alguma ou duas portas sempre às cegas, e ela ficaria só, a venda tirada, em pé, no meio de um quarto escuro, onde a deixavam meia hora, uma, duas, não sei, mas era um século. Depois, quando enfim a porta se abrisse e acendessem a luz, via-se que ela havia esperado num compartimento muito banal e confortável, mas singular: com um grosso tapete no chão mas sem um móvel, todo rodeado de armários. Duas mulheres abriam a porta, duas mulheres jovens e bonitas, vestidas como umas lindas criadas do século dezoito: com compridas saias leves e ondulantes que ocultavam o pés, corpetes justos que fazia empinar os seios, laçados ou acolchetados na frente, rendas em volta do pescoço e mangas que iam até meio dos braços. Olhos e boca pintados. Usavam um colar muito apertado em torno do pescoço e braceletes também muito apertados em volta dos pulsos.”


Pauline Réage
História de O
edições Sérgio Guimarães, 1976
Tradução de Orlando Neves

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