Custou-me dizer tudo aquilo: tinha dificuldade em encontrar as palavras certas. Ela ali estava, com os olhos fechados, deitada no chão com a saia levantada até ao ventre. Tornei a sentir aquela coisa que me vinha pelas costas e a minha mão apertou-lhe a garganta sem que eu mo pudesse impedir; e apareceu; era tão forte que a larguei e quase me pus de pé. Ela já tinha o rosto azulado, mas não se mexia. Deixara-se estrangular sem reagir. Ainda devia respirar. Peguei no revólver de Lou que tinha no bolso e disparei-lhe duas balas no pescoço, quase à queima-roupa; o sangue começou a jorrar aos borbotões, devagar, em golfadas, com um ruído húmido. Dos seus olhos só se via uma linha branca através das pálpebras; ela teve uma espécie de contracção e acho que foi nesse instante que ela morreu. Virei-a para não lhe ver mais a cara e, enquanto estava ainda quente, fiz-lhe o que já lhe fizera no quarto.
Boris Vian
Irei cuspir-vos nos túmulos
Relógio d'Água, 2003
Tradução de Maria João Costa Pereira
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