Quando Eva está sozinha, só a alma a surpreende. Em tantas pequenas alegrias e tristezas é bom não haver mais ninguém presente. Só o alívio de não ouvir «O que é que foi?» cada vez que qualquer coisa é! As pessoas perguntam muito. Não se pode rir, ou deitar fogo a umas flores secas, ou encharcar de lágrimas um urso de pelúcia, sem alguém estragar tudo e perguntar «O que é que tens?», «O que é que estás a fazer?»

As pessoas têm todas uma costela alfandegária - querem sempre saber o que trazemos dentro de nós. Põem o nariz entre a roupa suja, à procura de diamantes ou de droga, como se estivéssemos a esconder qualquer coisa. De preferência, espectacular. Como, por exemplo, a nossa razão de ser.
(...)


Miguel Esteves Cardoso
A Vida Inteira
Assírio & Alvim, 1995

Sem comentários: