«por vezes a tua cara torna-se nítida e insuportável. Outras vezes, esbate-se e com o esbatimento vem-me a resignação de te ter perdido. Às vezes, esqueço-te. Ou ficas escondido numa casa, num quadro, numa árvore, de onde ressurgirás. Um dia olharei o quadro, a casa, a árvore e lembrar-me-ei de ti. Mas cada vez haverá menos sítios onde te esconderes.

a tua face vem e atira-me sempre para o mesmo tempo, é uma face que o ódio esquece, anterior à deserção, a face de quem encontrou a primeira palavra, é essa que me olha nos sítios mais vulgares. Não te procuro: de repente; estás ali. Como uma arma. O límpido assassino.»



Rui Nunes
Ouve-se sempre a distância numa voz
Relógio D´Água, 2007

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