dissolver o cansaço na aspirina o açucar e a angústia
a lembrança no sono o tropeço os falhanços, ligar
com cimento, construir
chorar de vez em quando às escuras para a febre descer
polir palavras com escova colocá-las com pinça
no interior, derramá-las num jarro sem vinho sobre o papel,
deixar secar, recortar, recompor, calar gritos, escrever
sonhar os poemas que não se escreve, escrever os poemas
[que não.
podar as plantas nos filhos, mostrar os frutos, o caroço,
o saco de luxo, a hora de ponta, suor, depois lavar, levar
o peito à rua, receber os outros, perdê-los, trocá-los,
devolver este par de mãos àquele mar, afogar em esforço
a carótida torcida do tempo, parar sempre noutra esquina,
fugir à vertigem com o prazer das alturas, perder,
permanecer sentado até à dor nos ossos, cronometrar paciências,
aprender na lentidão a única saída,
rápida
e envelhecer.
acreditar?
Manuel Cintra
Bicho De Sede
Ulmeiro, 1986
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