Musália

Seria nome de mulher por certo e o poema ao alto da página
onde tanto um deserto tanto um mar tanto a minha mão na tua
fazem casa e onde tudo afinal se abraça ali mesmo ao alto da página
seria musália nome de mulher volátil na língua e demorada fenda
na rima e a ágil soltura na música musália assim dita musália palavra
antiga lenda ou ritmo balanço encanto e álea da mulher futura
e o poema a fazer da página miradouro sobre a mão e o papel e a sombra entre
a mão e o papel e o nome de mulher nome de tesouro
digamos ouro ou pedra e cinzel e as mãos redondas dançando em torno
e em torno a barca de um pequeno donzel amadis do mar donzel
sabendo das ondas e das garças e do nome musália
nome de mulher nome de terra nome de país
e de todas estas coisas
dir-se-ia séculos fora de um poeta fechado na pele
que não sabia que não soube ou que não queria e que não quis
poeta ao alto da página pesada poesia que povoas o papel
poesia que não és mulher que és silêncio sobre o papel que
dir-se-ia séculos fora de um poeta e de um país braços abertos
ao mar braços abertos como quem podia e não quis
entre os dedos os dedos de uma poesia mais alta
poesia mulher nome de terra nome de país.



Hugo Milhanas Machado
Da Palavra Mulher
Antologia, 2007

9 comentários:

L.N. disse...

poema distinto de outros do blogue do autor. vejo colagens a peixoto e muita musicalidade.

sê bem-vinda moriana, beijo.

Frederico Salema disse...

Parece-me certeira a escolha do primeiro poeta que por cá deixas.

Bem-vinda, também digo.

bruno vilar disse...

E assim a borboleta alucinada
esvoaça em torno da beleza.

Bem-vinda, moriana, acompanha-nos
por muitos e bons posts.

mar disse...

por acaso já tive oportunidade de viajar pelo mundo do hugo, tenho de concordar com o nunes, haverão pontas soltas que podemos associar ao josé luís peixoto. este poema é realmente muito bonito, provavelmente pela captura de imagens, pelo retorno à pátria, ao mar, pela minha casa ali posta em sossego...
ah, também consigo gostar da imagem mas talvez a colocasse do lado direito numa tentativa de não ferir o poema ou dificultar a leitura.

sê bem-vinda a este canto onde se aninham vozes maiores do que a gente.

beijo
deste
mar.

moriana disse...

obrigada, luís :)
belissimo poema, este, do hugo-

beijo.

moriana disse...

obrigada, José:)
tenho de concordar, a escolha foi certeira, sim.

moriana disse...

bruno sousa villar, bela imagem, essa, da borboleta:)

obrigada pelo caloroso acolhimento.

moriana disse...

olá, mar:)só posso repetir o que disse ao luís.
obrigada pelas palavras gentis.

a minha voz é pequenina, muito pequenina...

bj.

Hugo Milhanas Machado disse...

Que generosidade, amiga Moriana, aliás tão habitual...Fico muito agradecido.

De resto, o poema é teu.

Um abraço, felicidades.