Poema

Poesia não é uma medalha para pôr no peito dos tiranos mas uma imensa solidão feita de pedras, onde o despotismo pode encomendar o ataúde. Cada um de nós odeia o que ama. Por isso o poeta não ama a poesia que é só desespero e solidão mas acalenta ao peito as formigas da revolta e da rebeldia, que todos os déspotas querem submissas e procriadoras. Só os voluntários da miséria e da submissão patriarcal querem a poesia na arca da aliança com a tradição pacóvia e regionalista dos pretéritos dias, glórias patrioteiras, heroicidades fustres, pirataria ígnara. Todo o verdadeiro poeta despreza o pequeno monte de esterco onde o dejectaram no planeta e a que os outros chamam pátria, e só ama os grandes continentes mares e oceanos da liberdade e do amor. Só nos vastos espaços incriados a poesia serve o seu destino – catapultar o homem nos abismos do desejo incontrolado onde o próprio assassinato é um acto de poesia e de amor. Este assassinato de que falo é o grande amplexo de homem para homem a solidariedade e a ternura, não a caridade hipócrita ou a cama de família, com todo o seu pequeno cortejo de horrores, onde a exploração do filho pelo pai dita a sua lei.



Pedro Oom
Grifo, 1968

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